quarta-feira, 22 de março de 2017

Trinca

os ossos estalam contra o sol
a carne não é tão dura assim
se os letreiros de neon dos ônibus
pudessem
fazer desenhos íngremes na linha
das vistas
tapeando o azar, o excesso
de lucidez
se os sinais de trânsito fossem todos
verdes
tivessem todos infinitos tons
de verde
se no meio da vida
um escândalo
ah
mas obrigações de plástico prendem
a circulação
e verdes quase e só
as green machines os dedos da mão
o cinto filantropicamente estrangulando
os estômagos
e um estrondo despencando
dentro dos bueiros para alimentar
a loucura copulativa das baratas

não fomos nós quem dissemos
inspire e respire devagar
sessenta vezes
enquanto usinas explodem em ilhas
longe daqui
inspire e respire devagar
o que são duas horas de espera
diante do suor das correntes

em casa, automática
a xícara de café quente
uma linha horizontal férrea na boca de alguém
onde um dia houve um sorriso
abaixo do solo
os mortos
as baratas
a beleza
em putrefação
descondicionada do visível aos olhos
independente
como jamais seremos

o cinto cai no chão do banheiro
deixa marcas lá e aqui como
pequenos dentes e a urina
explode com cheiro de dia seguinte

não desperdice o café quente.