sábado, 27 de dezembro de 2008

Queridos,

É muito provável que eu não termine os meus 10 religiosos posts de dezembro, porque ando meio sem tempo, correndo dum lado pro outro, fazendo coisas em casa, arrumando roupas - viajo dia 29 e só volto em janeiro, nem sei quando.
Me compreendam, é fim de ano! Sei que vocês vão compreender, porque são muito legais comigo! Juro pra vocês que vou compensá-los com os posts que vou ficar devendo.
Beijo beijo beijo, bom fim de 2008 pra todos vocês!

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Quem grita seus males espanta

É bom gritar. Muito. Às vezes, quando eu grito, é como se estivesse colocando pra fora toda espécie de dor, de euforia, de excesso. Gritar é uma espécie de terapia, e a mais barata das terapias. Seus efeitos a longo prazo aliviam, relaxam os músculos, nos deixam com uma ligeiramente tonta, mas profunda sensação de liberdade.
Quando estamos felizes, gritamos. Quando estamos vendo um grande ícone de nossa geração a 300 metros da gente, gritamos, pois sabemos que se em parte vivemos, foi pra ver aquele momento. Gritamos quando um amigo morre, na tentativa de impulsionar a elevação sidérea do seu espírito pela força do nosso grito; na tentativa de expulsar essa dor que se abate sobre o nosso corpo frágil, humano demais.
Tem gente que grita a toa; um modo espirituoso de viver, muito comum entre meninas. Vejo de forma engraçada esses 'gritinhos', mas também interessantes manifestações de felicidade espontâneas. Eu gosto disso, quando estou feliz tenho esse estranho costume de gritar por nada.
O grito é humano, e ninguém ensina. Ele é a primeira coisa que sai de nossas cordas vocais, e às vezes é a última. É um sinal de vida, de socorro. É um sinalizador de que estamos aqui, precisando de alguma coisa, um reclame, que sobe inflamando-nos a boca, que encontra no ar o seu reprodutor.
É bom gritar ao ar livre, num campo bem aberto, sem nenhuma obstrução. Aquele vento batendo nas roupas, passando pelo nosso rosto, braços bem abertos e olhos fechados. Gritar, nem que seja qualquer coisa. "Gerônimo!" "Eu estou vivo (a)!", "Meu nome é (insira-o)!". Sei lá. Pelo menos a mim, quem grita seus males espanta.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Entre Macunaíma e Homer Simpson

Cada nação, um herói. E um herói diz muito sobre o povo que habita esta respectiva nação. O herói é a personificação de um apanhado de aspectos comuns à gente de dada comunidade e, uma vez reunidos, são depositados numa pessoa, e o heroísmo é uma delícia e um fardo, simultaneamente. Mas, em direção à terceira margem do rio, também é possível associar ao herói uma outra característica: a ironia, que particularmente acho bem mais atraente que as citadas. Ela é o principal ingrediente na construção do que chamam anti-herói. Mas o que é o anti-herói que um retrato do povo? Um povo inconstante, de sorriso e mazelas? Os heróis virtuosos são distantes demais; os trágicos são enfadonhos demais. Já os anti-heróis unem e temperam com maestria estas disparidades. Então, o que é melhor que um anti-herói na representação de seus conterrâneos? Sem querer, a contradição faz a lei: o anti-herói é o próprio herói!
Nosso melhor e mais preci(o)so é o famoso Macunaíma andradiano. Vê só se não é a imagem e semelhança do brasileiro: malandro, genioso, lascivo e preguiçoso. Talvez me apareça aqui uma meia-dúzia (ai, como seria bom!) pra me contradizer; mas aos meus olhos, o herói brasileiro não pode ser melhor representado que Macunaíma, filho legítimo do Brasil, aquele que carrega nas costas a identidade nacional; mosaico exato da nossa história.
Mas, pulando fronteiras internacionais, saio em busca dos heróis dos outros países. Da Argentina, meu emblemático e querido Ernesto. Da Itália, Vito Corleone. Dos Estados Unidos... não se atreva a dizer Abraham Lincoln, a explosão pop Obama ou o maldito Ronald Reagan: o maior herói americano de todos os tempos é contemporâneo, mais novo que eu mesma e nunca personificou tão bem a alma dos americanos como o amarelo Homer Simpson de Matt Groening. Este capta com uma precisão assombrosa a essência do comportamento sedentário, periférico, desvelado e sincero dos norte-americanos, por trás de todo o falso moralismo socio-histórico no qual os mesmos estão envoltos por uma fina cortina de hipocrisia. Homer bebe a lot, é sonolento e cansado, insatisfeito com seu ofício profissional e um devorador assíduo da mídia de seu país, o que o deposita num patamar imbecializado de ser; Bart teria possíveis problemas com drogas no futuro, Lisa é uma nerd delicada e introvertida. Isso é plano de fundo o suficiente pra um "Beleza Americana II". Reflete a realidade de um povo que está far away do american way of life; ideário que, a propósito, está morto. Porque as pessoas, então, tendem a rechaçar a realidade enquanto identidade nacional?
Acho uma grande besteira negar a matéria que nos compõe. Que imagem você quer passar? Que mentiras quer transmitir? Macunaíma está para o Brasil como Homer Simpson está para os Estados Unidos, os americanos e brasileiros gostando ou não. E os dois não buscam exatamente nada epifânico ou revelador: são só duas personagens que estão contentes da sua condição e não estão lá muito interessadas em mover suas bundas gordas em direção a uma mudança. Um herói não é um estereótipo. É um emaranhado de vestígios reincidentes e renitentes no âmago de uma sociedade friamente repartida e exposta, e no meio desse amálgama, lá estão, em algum lugar, Grande Othelo e Dan Castellaneta proseando em meio a café e cigarros.

O discreto charme dos esquisitos

Vá lá, em todo esquisito mora um charme que nós, - até onde pensamos - normais, não sabemos explicar. Eles são desajeitadões, indies, nerds, geeks, grandes demais, parecem não caber em lugar nenhum. Muito magros. Muito gordos. Médios; cabelo no olho, lentes enormes, narizes enfiados em livros, e cacoetes: bem vindo ao estranhamente sedutor universo dos esquisitos. Muitos bonitões dizem ter prazer em zoar esses 'tipões' desde a infância, - isso é muito bem documentado em produções trash-baratas de sessões da tarde dos anos 90 - mas acho que no fundo é por medo. Cientes do charme incomum dessas criaturas exóticas, os fisicamente abençoados tremem na base, se sentem inseguros diante da ameaça de perder a namorada pra um esquisitão. Maginou a humilhação?
O discreto charme dos esquisitos é quase invariavelmente marcado por uma timidez incorrigível. Não que sejam pouco sociáveis, mas são bem excêntricos. Na hora de uma conquista, essa galera acaba desfavorecida justamente pela inabilidade com as palavras, a falta de jeito; coisas que, dependendo da ótica, também podem acabar se convertendo em pontos positivos. Afinal, esquisitão é charme. Esquisitão é tendência. Esquisitão é moda. Oras, não venha me dizer que Marcelo Camelo, Mari Moon, Agyness Deyn, Ringo Star e Quentin Tarantino são normais!
Eu já arrastei um rabinho de olho pra esquisitões na rua. Eles são atraentes, à sua moda. E é interessante ver a locomoção deles, vê-los evolvendo-se pelas ruas e avenidas, chegando atrasados, ensopados de chuva, com mancha de catchup na roupa branca, com um floco distraído de poeira no cabelo. Eles são demais. Sem querer, são a essência do cinema cult e da cultura pop.
Esquisitões estão dominando o mundo, e tenha dito!

Já é natal na Leader Magazine!

... vai dizer que o ano inteiro não passa, como num filme, pela sua cabeça, quando você ouve esse alegre jingle que já habita o subconsciente coletivo durante todo o mês de dezembro? É a hora em que este fenômeno propagandístico da Leader joga na nossa cara que -wow!- já é o último mês do ano... e o que fizemos dele? [...]
Meio piegas escrever sobre um possível balanço de 2008 aqui. Acho que nos outros 70959345930493957348 blogs existes, todo mundo já deve estar tratando do tema com a peculiaridade sensitiva que lhes é característica. Mas e eu? O que eu falarei aqui a respeito? Do meu medo do futuro, das minhas espectativas? Das coisas muito boas que me aconteceram no decorrer desse ano, das péssimas? A criatividade me deixou às escuras agora, e odeio quando ela faz isso. Pois bem. Vamos tateando e ver no que dá.
Sempre que um ano se encerra, faço promessas que não vou cumprir para o próximo. O pior é que já sei que não vou cumprir, mas ainda assim, olho praquelas estrelas convidativas e lanço minhas promessas aos céus. Não sei. Acho que é a força da revolução solar, ou alguma influência planetária, que enche as pessoas de vontade de mudar, ainda que essa vontade se restrinja só mesmo à hora de abrir o champanhe e confraternizar aquela alegria meio que obrigatória e cronometrada. Nada contra essa efusão; mas gostaria que ela se estendesse para os meses seguintes, pelo menos um pouquinho [...]. Me dou conta de que é impossível. Apesar de surtirem efeito limitado, festas de fim de ano têm essa função de injetar felicidade nas pessoas, por pior que elas se sintam, generalizadamente falando né, porque convenhamos: o fim de ano de certos catarinenses não será dos melhores.
Mas não custa a gente mentalizar coisas boas para o ano que vai nascer. A positividade rege a espécie humana, a capacidade de superação das coisas ruins sempre se sobrepõe às adversidades. É humano isso, de achar que vai mudar pra melhor, de se ancorar na esperança. Detesto quando meus posts ficam com cara de auto-ajuda, mas em certas circunstâncias é muito difícil fugir disso. Como agora. Momentos auto-ajuda me emparedam aqui, mas são eles que nos devolvem a crença em dias melhores. Não é um defeito ser positivista!
Enfim, acho que 2009 será melhor que 2008. Como achei que 2008 fosse ser melhor que 2007, e segue-se a corrente. Afinal, todo mundo tem fome de boas mudanças, e isso é um defeito inerentemente humano que dá continuidade a esse equilíbrio delicado que chamamos de vida.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

À Cyrill Connelly

Vou escrever. Vou me derramar. Vou contar tudo. Mas não abro mão de ser quem eu sou. Da minha escrita, que é só minha, irreproduzível, como a sua. Pode ser que ninguém venha aqui. Que ninguém venha, em meses, em anos. Mas vou escrever. Vou escrever.
Vou escrever porque é escrevendo que me encontro. Porque escrever me consola entre as vicissitudes da minha vida. Posso nunca alcançar o sucesso, nunca ser reconhecida pelo que faço; mas faço, e continuarei fazendo. Porque faço por mim, pela minha salvação, pela minha redenção. Escrevo pra mim, pra vocês, mas não para uma mídia.
A minha escrita é incorruptível. É autônoma. É pra ela. Minha escrita é um presente pra si mesma, independente do julgamento de terceiros. Ela nasceu dia 27 de julho de 1988, numa tarde fria de quarta-feira, junto comigo. Mas espero que não morra, e que este blog funcione como um canal para a sua imortalidade.
Cyrill Connelly, prodigioso escritor inglês, uma vez disse uma coisa que jamais vou esquecer. "É melhor escrever para si mesmo e não ter público, que escrever para o público e não ter você mesmo." Eu levo à risca o que disse Connelly, ele está absolutamente certo, seja a época que for. Isso não é uma frase, é um axioma. É um preceito que todo blogueiro/a deveria seguir.
Vejo muitas pessoas escrevendo coisas nas quais não acreditam. E não convencem. É feio e vexatório fazer isso consigo mesmo. É tentar enganar à própria escrita. É forçar. Não force. Relaxe. Escreva o que tem, escreva com o que tem. É fugir à essência imitar, plagear; o que é diferente de se inspirar em, referenciar-se em. Se for escrever, que seja você. Ainda que você reúna um amontoado de clichês, ainda que considere seu texto pobre: ele é parte de você. Lapide-o, se precisar. Não se incomode com a estética, mas atenha-se ao conteúdo. Diga. Cuspa. Vocifere. Eu não saberia conter meus dedos e meus pensamentos desordenados numa métrica já inventada. Deixo-os soltos para que cresçam e amadureçam. Na minha escrita, eu mesma faço as minhas regras, e essa é uma de suas maiores características. Eu respeito a minha escrita.
À Cyrill Connelly. É assim que eu vou ficar.

Até dezembro!

Egoístas

Nada além dos headphones. Sem choro de criança. Sem buzinas dos carros. Sem cantoria de passarinhos. Sem moedas caindo da carteira e tilintando no chão para que sintamos falta depois. Sem chamados e acenos de amigos que não vemos há tempos. Sem pessoas puxando assunto. Estamos absortos demais em nós mesmos para prestar atenção a tudo nos rodeia, e que nunca irá se repetir da mesma forma para que redimamos o nosso erro. Nada além dos headphones.
Ô coisa! Cada um cria um mundo, completamente internalizado e individualizado dentro dos pequenos egoístas eletrônicos - faça a metáfora, se for do seu gosto. Cada qual com sua trilha sonora vital. Seus sentimentos. Suas grades auditivas. Ninguém arrisca uma conversinha no ônibus. Ninguém sorri na rua. Todos os ouvidos estão ocupados demais com sons particulares e familiares demais. Ninguém experimenta dar-se à oportunidade de engatar um papo saudável e amistoso com o estranho ao lado. "Pode ser perigoso, eu não sei quem ele é, de onde veio, pra onde vai". E insere-se os headphones, numa tentativa convencionada e medrosa de se abortar o mundo e o coletivismo sonoro. Poluição sonora! Mal do qual não quero e não vou morrer!
Nunca inventaram nada mais antissocializante. Ouvidos tornarão-se débeis e seriamente comprometidos daqui a dez (?) anos, mas quem se importa? Qualquer tentativa para ficar no seu quadrado é válida. Headphones. Sondas estéreis de silêncio externo. Ouvidos sangrativos de tanto headphone!
Nunca inventaram nada mais introspectivo. Nada que privasse tanto do barulho existencial, que move a vida urbano-social. Nunca inventaram nada mais estúpido e rentável, mais canceroso e individual. Estamos vendo a ascensão da era dos individualismos. Em breve, disponibilizarão toda sorte de portáteis na loja mais próxima da sua casa, mas especialmente aqui fixo-me nos headphones e toda a gama de malefícios que ele é capaz de trazer, a curto e longo prazo, interna e externamente.
E assim cada pessoa envereda-se por seu caminho, sem imprevistos, sem cortar sua corrente. Calculando seus passos. Sem esbarrar em ninguém. Cada pessoa isola-se no seu pequeno universo artificializado de inaudibilidade humana, de relações sociais impossíveis, no amarelo de sorrisos que não veêm sol. Cada pessoa reparte consigo, e só consigo, a interpretação das músicas, a estética do som, a crítica mental inerte, infrutífera. Cada um toma a sua reta, seu fio. Fio tênue de ignorância, descontexto e solidão.

domingo, 23 de novembro de 2008

Complexo de Hayworth

Eu não gostaria de sentí-lo, mas eu sinto. Na verdade, detesto. Mas o fato é que anda difícil conversar com um homem que não esteja meramente com o olhar ausente em uma outra parte do meu corpo que não seja a cuca.
Odeio ser tratada como SOMENTE uma mulher gostosa, e não que eu me considere uma, mas acredito que muita gente me descredita por conta de, sei lá, (não tem como não falar isso sem emanar uma certa pretensão involuntária) me acharem... bonita. Eufemisticamente falando, é claro. Pô! Eu tenho um cérebro aqui dentro! Eu sei conversar sobre vários assuntos, menos futebol. Sei me divertir, passando por esses assuntos, sou inteligente, caramba. Mas tem gente que insiste em ver só a casca, o que eu acho de uma natureza tão pobre e insensível que beira a instintividade irracional.
Mas quando eu encontro alguém pra conversar... aaaaah... como flui, como é bom conversar com alguém que está vendo a Ana Cabeça, não a Ana Bunda, ou qualquer outra droga do gênero. Excepcionais são os casos que fogem a essa regra no meu convívio (até porque meu núcleo de amizades é composto 85% de mulheres), e em excepcional conta tenho esses amigos de verdade, porque sei que não me veêm com aquela maldade característica dos machões-boça. Não que o resto seja machão-boça. Mas, no caso deles, trabalhar essa veia facilmente resultaria nisso.
Talvez eu seja mal-interpretada, não sei. Acontece que gosto de fazer amizades. Virtuais, reais, à distância, em qualquer plano: fazer amizade com homem, com mulher, com gay, com lésbica, com cachorro, traveco, ah, não dispenso. Tenho um certo carinho inato pelas pessoas que cruzam o meu caminho, e quando isso não acontece é que é raro. Muito difícil eu ter implicância com alguém, mas ultimamente esse meu lado implicante tem se desenvolvido sobre esses caras escorregadios que, literalmente, não veêm meu coração. Por que? Por que essa pressa, essas segundas intenções nas relações homem X mulher? Não é porque eu sou assunto a alguém que quero, necessariamente, ter algo mais com aquela pessoa. Eu quero só trocar idéias, uai, e que mal pode haver nisso? As pessoas veêm maldade em tudo. E essa maldade acaba por ME afetar negativamente, o que é super chato. Perco a confiança em quem fica de maldades comigo. Às vezes penso que os caras só chegam em mim pra dar alguma investida. Chato. Nojento. Desprezível.
Não acontece só comigo. Muita mulher bonita (eu não sou bonita, reitero) é rotulada disso e daquilo muitas das vezes sem nem saber do que se passa em torno de seu nome. Fui descobrir uma dessas na prática. Na faculdade, outro dia, conversei com um vestibulando na hora do meu lanche. Papo tranquilo. Dias depois, um amigo chegou e disse que ele havia espalhado que eu "tava dando molinho". Quis enfiar a cabeça no vaso de raiva, mas passou. Passou, mas a lição ficou. Infelizmente, tenho que aprender a medir minha língua com aqueles que não conheço. O pior é que fiz uma retrospectiva mental e não achei NADA que me comprometesse no assunto. Tenho, no fundo, pena desse tipo de homem porque, ao que me parece, esses são os mais carentes e descerebrados.
Mas minha dúvida é fixa, e viso repartí-la com você perguntando: o problema está em mim ou nos outros? Quem me conhece, que o diga!

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Os homens, ah, os homens...

Vinícius cantou às mulheres. Toda a sua poesia, sua vida e seu legado estão entremeados pela sua total ode à figura feminina. Ele foi um dos maiores amantes das mulheres, no sentido devocional do termo, e deixou isto exposto para o mundo ver. É muito provável que o gene viniciano tenha morrido nos homens. Não se fazem mais homens românticos, o que é uma pena. Mas não se iluda, leitor, que de romântico Vinícius só tinha o gênero literário. Ele foi, no mais claro português, um galinha inveterado, mas inteligente. Muito inteligente, e passionalíssimo.
Como Vinícius, muitos poetas e artistas viveram intensamente, promovendo verdadeiras elegias ao sexo oposto, se dando, seja em palavras, seja com o próprio corpo. Acho isso de uma coragem e beleza incríveis. Numa sociedade que censura a mínima pisada fora da linha, estes preteriram todo o corpo fora. E chegou a minha vez, também. Abrirei o peito na direção dos canhões morais.
Os homens, ah, os homens. Magros, médios, negros, ruivos, louros. Lindos. Há uma beleza nos homens que somente um olhar feminino é capaz de contemplar com plenitude. Gosto da anatomia masculina. Gosto dos braços, dos pulsos, dos pés, das mãos dos homens. Gosto de seus pêlos. Gosto de um pomo de adão pronunciado, gosto de queixos e narizes. E, principalmente, gosto de homens naturais. Descontraídos, risonhos - ou sérios. E pênis. Aquela forma deliciosamente fálica guarda metade do segredo da vida - a outra está em nós, mulheres. O pênis masculino abre um manancial de gozo e delírio em mim. Eu gosto muito de homem.
Só uma bela figura masculina emana feromônios poderosos a todos os meus sentidos. Homens me despertam. De ternos, de fardas, de batas hippies, não importa, são homens! Os homens são lindos, lindos. Acho que, analisando por esse ângulo, entendo o motivo do homossexualismo masculino. Como resistir a um bom homem? Como passar incólume por aquele homem, sem dar uma discreta suspirada?
É difícil uma mulher, numa sociedade predominantemente machista, falar ao homem assim, principalmente sendo monogâmica, o que é o meu caso. Mas não vejo outra maneira. Aqui, estou inteiramente despida de qualquer princípio moral ou social; estou falando por mim mesma e pondo, quiçá, minha conta em risco. Me responsabilizo pelo que falo. Faço a canção ao belo, não ao promíscuo, e esse é um ponto que precisa ser levado em consideração. Mentalidades preconceituosas não conseguem dissociar isso com precisão. Elza Soares, Fafá de Belém, Zizi Possi, Leila Diniz, entre outras bravas me servem de inspiração. Elas interpretam a real beleza de um homem bonito, gostoso, sem sentir necessariamente aquele descontrole dentro de suas calcinhas. A questão aqui é de apreciação, não da banalização. Não tenho nada contra as mulheres que se relacionam com muitos homens, quem sou eu pra julgá-las? Só acho que entregas assim devem estar, primeiramente, calcadas na admiração pela figura masculina. A banalização que evidencio é a pessoa ter-se com quem quiser por mera carência ou desejo repentino, o que, aí sim, não concordo.
Mas, fora isso... os homens. Ah, os homens...

domingo, 16 de novembro de 2008

A rua do meu passado

A rua do meu passado tem belos e expressivos olhos castanhos, que vão me tragando por uma larga alameda por onde vou me perdendo à medida que vou me encontrando, dentro. Seus galhos são braços fortes, que me consolam, que são invadidos de uma luz lindamente turva em dias nublados. Ah, dias nublados. Em dias nublados, minha rua enegrece a ponto de virar noite em minutos. E nem assim perde a sua beleza. Se veste de mistério, de sobriedade, e de passado. De passado, de passado, de passado.
A rua do meu passado é muito bonita no final da primavera. Densamente encharcada daquele gosto e cheiro de chuva fresca, inundada com as cores vibrantes da transição das estações. Às vezes, consigo ouvir beijos vindos do oco das árvores que nela moram, porque, afinal, ela é a rua do meu passado. A rua me entende. Ela, seus sons, suas luzes, ela me completa. Eu começo o que ela termina, e vice-versa. Essa rua é um pedacinho de mim, que o tempo e a geografia tiveram o cuidado de preservar, tão delicadamente, tão pra mim.
A rua do meu passado me parece espiralada, como um turbilhão infinito de memórias e emoções à flor da pele. Ela tem um sorriso lindo que me entontece, toda vez que o contemplo. Parece que sabe o que quer, mesmo que isso implique em me dissociar de sua história, embora esta nunca possa ser apagada. Essa rua me sucita sentimentos tão fortes que tenho medo de me aventurar pelos seus 600 metros de asfalto e infinitude numa simples caminhada. Nem passo ali, nem que seja pra cortar caminho. Ela traz à minha boca um gosto acre de lembranças doloridas que prefiro adormecer num recôndito profundo no peito. A rua do meu passado está situada em algum lugar da minha cidade, em algum lugar do meu corpo, em algum lugar dos meus homens.
A rua do meu passado está impregnada de silêncio e nostalgia.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Coração sem sujeito

Há uma inquietação
Pulsando dentro do peito
Uma aberração
Um descompasso
Um defeito.
Há uma falha
um fosso, uma vala
Inflamável palha
Um descontrole violento de se arrebentar
e se espalhar pelo chão em cacos
de sangue, de desespero.
Há um sonho fetal
que ainda não foi feito
na insustentável possibilidade em ser
perfeito.
Há um anseio vazio
Um vão amargo no meio
Um despropósito vivo
Pulsando dentro do peito.
Nada há porque nada pode haver
E o haver salga.
No olho cego desse desassossego
lateja um desejo sem jeito
No coração sem sujeito.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Blasé: quando a indiferença vira moda

Confesso que fiquei um tempo pra sacar qual era a desse termo. Sempre o via (com meus olhos pré-conceituosos) muito ligado a assuntos relativos à moda, e inclusive já topei com ele por aqui, na blogosfera. E o tal termo me intrigava, por isso, de curiosa que sou, fui atrás dele e...
Touché!
Não me surpreendi muito quando vi o seu sentido no Oráculo (aka Google). Depois, analisei os textos em que lá estava o vocábulo para melhor assimilá-lo. E grande coisa. Minha reação mesmo ficou por conta de quem adere o estilo blasé como filosofia de vida. Pelamor. Tem coisa mais chata que gente blasé? Se eu tiver lido pouco a respeito, que o blasé dentro de você que agora me lê me repreenda. Mas, até onde li, concluí apenas que minha meta é manter uma distância segura entre mim e um blasé.
Nada para eles é novidade. Se consideram os know-it-all da moda, da música, da arte, e nada lhes causa comoção ou qualquer espécie de reação. Eles são irritantemente estáticos, com suas caras inexpressivas e seus olhares alheios. Como é que uma babaquice em tão alto grau pode virar uma febre? Isto que me intriga. Que graça existe em ser blasé? Na minha leiga opinião, blasé é somente uma justificativa expatriada para ser antipático com uma relativa classe. Preciso inserir aqui que respeito profundamente o direito das pessoas serem fechadas, instrospectivas, não rirem com facilidade - tenho, inclusive, grandes amigos com essas características, e meu namorado até - mas tentar legitimar uma sociopatia com uma palavra francesa não dá. (Nossa, forcei.)
Espero (fervorosamente) que isto, como qualquer outra modinha, esteja com seu prazo de validade às vésperas do vencimento. Não dá pra agüentar por muito tempo gente de nariz em pé que, por crer que pode construir uma bolha ao redor de si, pode conseqüentemente desprezar/ignorar os demais. Egocentrismo tem limite, e este se evidencia quando a excentricidade toma as rédeas da razão.
Fim aos blasés!

domingo, 9 de novembro de 2008

Corrigir, não corrigir

Eu não sei quanto a você, caro leitor, mas quando um erro gramatical oralizado entra pelos meus tímpanos, ele pertuba a minha paz interior. Os mais entendidos podem até alegar a gramática internalizada do falante, seu léxico particular, seu meio. Mas eu fico com aquele desejo comedido de corrigir quem foi o responsável pelo feito; mas preciso me policiar. Só que, enquanto não o faço, o erro fica lá, ecoando pelas paredes espelhadas dos meus ouvidos; entre a epiglote e a faringe. A última foi com a minha mãe. Certa feita, ela me disse: "No acidente, quebrou a cravícula.". Instantaneamente, saiu da minha língua nervosa o "cla". "É clavícula, mãe!". Ela me entendeu, mas deu aquela satirizada antes, como eu já esperava. Minha mãe não é do tipo que fala "framengo", mas a explicação pra "cravícula" é que foi uma notícia reproduzida pela minha avó, e, por não ser uma palavra no uso comum das duas, a versão da minha avó prevaleceu. E essa sim fala "framengo".
A questão que quero atingir não é o falar da minha mãe ou a minha avó, mas o ato da correção em si. Se de um lado, o meu interesse é unicamente ajudar as pessoas que pronunciam algum vocábulo erroneamente, por outro, posso ser (e sou!) mal interpretada e vista como alguém que se acha intelectualmente superior. Do ponto de vista lingüístico eu seria condenada, mas o que eu posso fazer se nos últimos 20 anos a prescrição gramatical influiu na minha vida de modo dogmático? Por mais que de uns meses pra cá eu venha sendo intruída a extinguir a idéia de "erro" da minha cabeça, não tem jeito: ele está lá.
Por isso que acho que o terreno da correção é movediço. Não sei se me calo por receio de magoar alguém (e deixar a pessoa continuar a reproduzir a transgressão), ou se falo e corro o risco de ouvir um quem-é-você-para-me-corrigir. De qualquer maneira, minha intenção não deixa de ser boa, apesar das conseqüentes interpretações. Acho simplesmente de um espírito de porco quem usa conhecimento como status. Que é o conhecimento senão uma ferramenta de reprodução, e pública, e plural? Quanto mais o transmitimos, mas o adquirimos!
É. Não me importa de ser mal vista por um instinto que vem de dentro de mim. Por isso, vou continuar, polidamente, a ajudar os mais incautos. Até porque, é só através da educação que a gente muda as pessoas de dentro pra fora.
Boa noite!

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Minha melhor amiga é solteira. E agora?

Queridinhos, eu sei que é duro mas, inesperadamente cheguei ao décimo post, e agora a regra é que todo mês eu só vou postar dez vezes. Ou seja, sem atualizações até novembro! Mas garanto que o último post de outubro será bem interessante e vai atingir vocês de alguma forma, combinado?
Sabe, minha melhor amiga é solteira. E como toda boa solteira, ela gosta de sair e se esbaldar nas festas. Fazíamos muito isso, só que agora tem um porém: estou namorando há quase dois anos. E pode não parecer, mas é super difícil balancear isso. Ela se mudou para outra cidade, e, quando vem ao Rio, a primeira coisa que faz é me chamar pra sair. Vontade não falta. Mas e meu namorado, caseiro até a alma? Entre a cruz e a espada, sem dúvida. Por um lado, saio e deixo meu namorado em casa, reclamando. Por outro, fico com meu namorado e ela sai, chateada. É bem complicado.
Minha mãe já me dizia que, quando a gente namora, tende a se distanciar um pouco dos nossos melhores amigos. E, diante da minha situação, pode ser que isso seja verdade. Antes, éramos só eu e Elisa, e eu não precisava dividir a atenção. Quando a gente ama muito duas pessoas e precisa aprender a dividir esse amor, pode ter a certeza que um lado vai sair em déficit. E eu sinto uma impotência tão grande da minha parte por ter de, certa forma, preterir uma pessoa a outra, ainda mais duas que me são tão vitais.
Elisa continua solteira. E feliz. Aliás, ela enrola um ou outro, mas não larga sua solteirice por nada. E, como a gente gostava muito de uma night, fica esse vão no meio da gente. "Vamos sair?" "Ontem!" Mas hoje eu não posso responder só por mim, porque tenho um namorado e não é nada legal avisar que você já está partying out na própria festa. Logo, devo umas explicações, porque meu relacionamento é calcado na confiança. E, como meu namoro tem qualidades quase extintas no mercado moderno, eu preciso preservá-lo. Mas amigas como Elisa são igualmente raras. O que fazer???
Não adianta, pensar é inútil. Infelizmente, cada escolha, uma renúncia. Quero os dois, mas eles são extremamente diferentes. Meu namorado é pipoca-e-filminho, minha amiga é redbull-e-electrohouse. E eu tendo muito mais ao lado dela que ao dele, mesmo amando-o até onde existe coração. Administrar essa diferença é uma tarefa insana, mas nada que um bom jogo de cintura não resolva.
Desejo sorte aos que passam pela mesma situação. Porque problema é não ter melhor amigo (a) ou namorado (a).

Beijos gente, até novembro! =]

À estupidez legitimada

Olá, meu fantasmagórico leitor. O post de hoje é um manifesto de rechaço à estupidez legitimada presente nos TAF's das muitas instituições militares espalhadas pelo Brasil e mundo afora. Você deve estar aí pensando "Mas que diabo é isso, Ana, isso não tem nada a ver com o que eu e os outros fantasmagóricos leitores assíduos do seu blog estamos acostumados a ler! Perdeu a cabeça?!" mas, na verdade, foi após uma noite em claro que me certifiquei, definitivamente, que não há necessidade por parte dos superiores, generais, sargentos e o cacete a quatro de agir com essa rispidez em relação aos concursados.
Se você caiu neste blog por acaso (e que feliz acaso te trouxe até aqui!), e é justamente um desses superiores, generais, sargentos ou o cacete a quatro, certamente vai se indagar, com um sorriso no canto da boca: "É mesmo papo de vagabundo-aluno-de-federal, acostumado à mamata do 'Estadinho'. Ainda por cima é mulher. Por acaso esperava, se fosse homem, chegar a um quartel e encontrar bananinha amassada e ar-condicionado? Como é que um soldado fisicamente despreparado seria capaz de enfrentar tudo aquilo que vai passar sem o TAF? Dá vontade de dar na cara de uma sujeita dessas..." Como se vê, em ambos os casos, há a inquietação. Mas eu sei do que estou falando, e vou justificar.
Meu namorado, Jefferson, está passando pelos amaríssimos testes físicos do CBMERJ (corpo de bombeiros do Estado do Rio de Janeiro). Ele está todo contente, e eu também, claro, porque foi duro - duríssimo - esperar ansiosamente pelo resultado e conseqüente classificação dele na relação emitida pelo site oficial do concurso. Tudo bem.
Os testes físicos começaram na segunda-feira, dia 13 de outubro de 2008. Rezei pelo meu Jefferson, desejando tudo de bom não só para ele, como para todos os outros combatentes que iriam se apresentar neste dia, em São Cristóvão. Ao chegar em casa, ele me ligou me contando (a barbárie): no asfalto rascante de 11:00, ele e os demais "caíram". Disse ele que, certamente, foi pra mais de 300 flexões pagas. O pior não é isso. Flexão, aquela que, nós leigos - isso te excetua, fantasmagórico leitor sargento, superior, general e o cacete a quatro - conhecemos, é aquela em que descemos e subimos. Mas meu namorado, como os outros, foi obrigado a pagar a tal "Flexão 2", que consiste em sustentar todo o peso do corpo na posição de flexão. No asfalto rascante e, só pra acrescentar, punho cerrado.
Mas isso não é tudo. Houve outras inúmeras desumanas provas que eu realmente gostaria de lembrar e pôr aqui. O resultado disso? Ao término destas provas, um dos combatentes prestou continência e caiu, com o corpo todo, de cabeça no chão. Às pressas foi levado para uma ambulância. Outros combatentes estavam exauridos até os ossos. Jefferson me mostrou seus ossinhos das mãos. Queimados e ralados. O rosto, muito queimado do sol. Inclusive, um de nossos amigos ligou para ele e disse ter sofrido uma insolação. O outro passou mal duas vezes durante o teste.
Não quero que vocês pensem que acho que tudo tem que ser "molezinha". É ÓBVIO que deve haver um esforço físico muito considerável - estamos falando de uma profissão que implica no salvamento de vidas, e não conhecemos a adversidade até vê-la de frente - . Os combatentes devem estar muito bem condicionados para pegar no batente, até aí tudo bem. Mas querer burlar os limites do corpo para poder trabalhar é que não concordo. Nosso organismo tem um limite, e é de alta periculosidade que tentemos transpor este limite. Querem dopping? Modificações genéticas? Então eles querem mutantes trabalhando, não seres humanos. Uma carga de exercícios justa, consistente, de largas horas, e que até desse uma dorzinha muscular, mas ministrada por cuidados posteriores, seria razoável. Mas isso não é tudo. Acho que não custa o superior, sargento, general ou o cacete a quatro forçar seus combatentes, porém, de modo a incentivá-los, não os pondo para baixo. "Vai, não pára não!", "Isso, vambora que dá!" são frases que surtiriam muito mais efeito que as agressivas que já são conhecidas por qualquer pessoa de fora. E o pior é que ainda há pessoas que acreditam que é por este método animalesco que "se aprende a ser homem". Se aprende a ser homem através da brutalidade? Com o perdão das instituições militares, mas os maiores homens são aqueles cuja força está no pensamento e nas palavras, não nos músculos e na agressividade.
Posso até estar equivocada, mas decididamente eu desacredito deste meio para se "fazer homens de verdade". Quanto à minha noite em claro, foi cuidando do meu namorado, porque ele estava com a dor muscular mais forte que já sentiu desde que se lembra, que ia do esternocleidomastóide ao antebraço. E dá-lhe massagem com cânfora, cremes, dorflex, duas injeções, gelo, compressa quente, mais comprimidos e uma noite inteira sem paz, tanto dele quanto minha. Isso não é, de maneira nenhuma, reclamação minha: é um prazer cuidar de quem eu amo. Mas foi este episódio, inédito em minha vida, que me fez refletir sobre o ideário parcialmente vazio do militarismo, aqui e lá fora.
Espero (e sei que é melhor pegar a cadeira) que essas instituições e corpos militares revejam suas posições diante da saúde de seus combatentes nestes testes físicos. Porque, sem ela, não se formam bombeiros; mas zumbis condicionados.

domingo, 12 de outubro de 2008

Eu, minha melhor advogada

Sabe, leitor, quando você está no erro, sabe disso e a chata da consciência - ou o peso dela - acabam te vencendo e você se entrega e assume: "eu errei, admito. Perdão."? Pois isso não acontece comigo. Ou, se acontece, muito, mas muito esporadicamente. Eu sempre tenho um ás na manga; a indecência e a cara-de-pau de passar a mão pela minha própria cabeça, e de me defender, por maior que seja a minha culpa, e, por mais que o meu cinismo vá paulatinamente despertando nos outros uma progressiva e finalmente incontrolável vontade de meter a mão na minha cara. Morro negando se for o caso, o que é diferente de mentir esbragadamente. Mentir à toa é muito sem glamour. Não direi que não minto, mas eu evito. Quando dá.
Espero nunca precisar, mas, se por obra do acaso ou do infortúnio eu houver de disponibilizar os serviços de algum advogado de defesa, eu poupo esse dinheiro. Porque se tem uma coisa que eu faço com maestria é me defender. O que vai pegar é que de legislação eu não entendo porra nenhuma, mas qualquer coisa a gente se vira. O importante, acima de tudo, é nunca se entregar; é se dizer inocente até acreditar em si mesmo. "Não, eu não peguei". "Não, eu não tirei do lugar". "Não, eu não fiz, não, eu não quebrei". E a consciência, você vai me perguntar e, lacônica, vou te dizer que ela foi dar um rolé com o namorado, o Escrúpulos. Tá, você vai pensar que eu não presto. E quem disse que eu quero? Hahahaha!
Morro negando, fato. Se entregar é - literalmente - pros fracos.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Idílio

Lembro com uma clareza absurda da manhã do dia 02 de outubro de 2008. Eu caminhava, voltando para casa, depois de uma de uma rave de 15 horas em Santo Aleixo. Minha cartucheira, minhas mãos, meus calos dos pés. Eu queria repousar no gostoso sofá da sala da minha casa, curtir aquele friozinho debaixo dos lençóis e dormir como uma pedra. O pessoal que me deu carona tinha me deixado próximo à minha casa, e eu não via a hora de me jogar pesadamente na cama, ao encontro de um sono repositor. Eu estava mesmo muito cansada.
Fui avançando a velocidade do passo, para que pudesse chegar mais depressa em casa. Tive, por um momento, a sensação de que, quanto mais eu andava, mais esticavam a rua. Depois, tive a certeza. Franzi os olhos e as sobrancelhas. Não estava acreditando naquilo. As pessoas indo para o trabalho passavam por mim com uma velocidade humanamente impossível. Assustada com aquela sensação inédita, estranha e asquerosa, comecei a correr. Mas todo o meu esforço descomunal parecia irrisório diante do andar dos outros.
Comecei a sentir uma horrível vertigem, uma vontade de me esconder, de ir embora. Aquele lugar estava me dando um enfado inescapável e insuportável. Aquele lugar era uma rua, tão ordinária, pela qual eu estava habituada a andar. Por que?
Eis que de repente, naquele amálgama de cores, sons e ondas matinais, veio caminhando na minha direção uma menininha, acompanhada de uma morena magra e muito bonita. A menininha estava uniformizada, tinha joelhos enormes e pernas magras. Cabelos presos no alto, que caiam pelas costas lisíssimos. Não sei o por que, mas tive certeza absoluta de que aquela mulher que a acompanhava era sua mãe. Elas eram as únicas pessoas que vinham de encontro a mim e na mesma velocidade que eu. Conforme foram se aproximando, eu pude identificar na blusinha branca da menina um signo de um colégio de freiras, o Colégio Santo Antônio, o qual eu também havia estudado. Lutando contra a vertigem imensa que me dominava, pude ver que a menina e a mãe sorriam pra mim. No começo achei que fosse delírio, mas era sim: elas sorriam pra mim. Estranhamente, espontaneamente. Quando finalmente ficaram no mesmo plano que eu que pude perceber o que se tratava. Se era obra do demônio ou do absurdo, eu nunca terei a resposta; mas a única coisa que digo é que desse episódio eu jamais esquecerei.
Fitei a pequena. Costeletas. Minha mãe também me penteava daquela maneira.
_ Você é real?
_ Sim, você é?
_ Se eu sou real, é impossível que você seja!
_ Por que?
_ Porque nós somos... a mesma pessoa!
_ Não, moça, eu só tenho cinco anos...
_ E eu tenho vinte!
_ Não pode! Eu estou indo pra aula da tia Adriana agora!
_ E eu estou voltando de uma festa agora. Daqui a pouco vou pra faculdade.
_ Eu vou fazer faculdade?
_ Vai. Vai fazer letras.
_ Mas eu quero ser veterinária!
_ Eu sei, Ana Líbia. Mas você vai acabar fazendo letras.
_ Como você sabe o meu nome? Quem é você de verdade? Letras eu já faço, olha só!
Ela puxou de sua pastinha azul um caderno com letrinhas garranchosamente contornadas. Eu ri.
_ Não, não é isso o que você vai fazer na faculdade.
_ Como que você tem vinte anos e eu tenho cinco?
_ Eu não faço a mínima idéia.
_ Eu acho que você tá mentindo. Eu não pareço com você, nadinha. Você é gorda, eu sou magra, meu cabelo é maior, o seu é menor e é diferente. E eu nunca usaria essa roupa que você tá usando!
_ Você é engraçada. Como que está o Godofredo?
_ Como você sabe do Godofredo?
_ Não disse pra você que te conheço, que aliás, eu sou você?
_ O Godofredo fugiu.
_ Imaginei. E a Ceci, latindo muito?
_ Ela ainda tá dormindo perto da máquina de lavar, e chora toda noite.
Eu sentia meus reflexos voltando ao normal, mas a imagem da menininha começava a enfraquecer conforme eu começava a melhorar. Ela então segurou minha mão e disse:
_ Eu tenho que ir agora. Minha mãe não me deixa chegar atrasada.
_ Eu também, a minha está me esperando em casa.
_ Tchau... moça...
_ Tchau, Ana. Vai crescer...
Pouco depois, o mundo à parte que orbitava em torno de mim começou a desacelerar até atingir a minha velocidade. O dia fresco que nascia invadia a minha alma, num baque retrospectivo e introspectivo que eu nunca havia sentido antes. Era eu conversando comigo, quinze anos mais nova. Era possível? Sempre fui a raves, nunca usei drogas, e tive a visão mais lisérgica da minha vida, pura. Era obra de quem? De Deus, do diabo? Um dia fora do tempo?
A verdade é que eu não esquecerei disso nunca. Nunca mesmo. Quantas pessoas passam por um evento assim na vida? Carregarei, com um êxtase eternamente fresco, a sensação do meu "monólogo", por assim dizer. E tentarei transformar a pequena Ana que vi naquela manhã em tudo aquilo que ela deseja se tornar.

sábado, 4 de outubro de 2008

Para compreender Deus

Se tenho duas únicas certezas nessa vida, elas são que um dia morrerei e que nunca, aconteça-me o que me acontecer, perderei a fé em Deus. Apesar dele me parecer estranho, às vezes. Apesar de permitir que coisas horríveis aconteçam às pessoas. Mas a fé, nele, ah, isso nunca perderei. Por que? Porque, mesmo parecendo distante e imaterializado, ele sempre arruma um jeito, um jeito só seu, de me responder. Não, nem sempre responde. Mas ele se esforça para que eu o veja.
Confesso que estou muito chateada com Deus hoje. Me pergunto por que, em sua infinita sabedoria, ele permitiu que um amigo meu fosse assassinado. Uma pessoa trabalhadora, que só estava galgando seu espaço nesse mundo. Que sempre trazia um brilho fantástico no olhar. Não éramos os maiores amigos, mas ele fará falta na praça. Lá que o conheci, e onde ele trabalhava. Seu sorriso, seu jeito engraçado e descontraído de fazer amizade. A notícia de sua morte me pareceu piada. "O Luan? Fala sério!" e assim me parece até agora.
É nessa hora que volto meus olhos a Deus, procurando, exigindo resposta. Por que? Por que ele? Um rapaz bom, esforçado, não se misturava com quem não presta. Por que ele? É justo? Se é ou não, isso não compete a mim, afinal, é a vontade de Deus. De Deus. Mas por que?
Fui buscar respostas no céu, que se desabava em uma chuva pesada nesta triste tarde de 04 de outubro. Estava no quarto, me perguntando a retórica "por que", quando a porta abriu. Pensei que fosse o vento, mas quando vi, era minha prima, Fernanda, que vinha chegando com sua risadinha feliz. Agora percebo. Era Deus entrando pela minha porta, mas não me dava por convencida estando com o coração duro de revolta pela morte do meu amigo. Eis que resolvi subir as escadas do meu prédio, que dão para o terraço. A chuva caía, impetuosa, livre. Só me pondo sob ela que pude entender. Seu beijo gelado, encharcando meus poros. O salgado das minhas lágrimas se misturando com o doce da chuva. Era Deus me respondendo. Raios e trovões rasgavam o céu de fora a fora. Deus conversando comigo. Eu quis gritar, mas já tinha a certeza de que ele já estava me ouvindo. E, lá dentro, nos recônditos dos meus tímpanos, eu podia ouví-lo dizer. Tenha fé, Ana Líbia, tenha fé.
Então desci as escadas e voltei, pingando dos pés à cabeça para casa. Tomei um banho e me pus a pensar na grandiosidade de Deus, e no seu mistério mais claro: a fé. A fé invisivel que salva a gente das horas mais amargas da solidão, e que nos traz de volta ao eixo. A fé, que abre os meus olhos e me faz ver o Luan sentado ao lado de Deus. Deus.
Horas mais tarde, eu sairia com meu namorado. Aliás, hoje nós completamos um ano e onze meses de namoro. Mencionei que estava com vontade de escrever, e sobre Deus. Eis que ele me pergunta: "antes de tudo, você precisa saber o endereço de Deus. Você sabe qual é o endereço de Deus?" a resposta veio, categórica. É certo que o endereço de Deus não são assembléias, igrejas. O endereço de Deus é o sorriso espontâneo da Fefezinha. As mãos estendidas e abertas de um estranho para o outro. A chuva boa que vem lavar a rua, a tarde, a alma. Deus mora nestes pequenos detalhes. E só é possível compreendê-lo fechando-se os olhos e abrindo - por completo - o coração.

Descanse em paz, Luan. A gente se vê um dia.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Real things to write about

I know it may sounds crazy to you, but the wind talked to me this noon. He was bleeding upon my neck, getting me thrilled, and he was doing it to all the other female creatures I saw around: leaves, trees, flowers, other girls. He was there and everywhere, shouting his name at loud among the dead wood, swipping the pages of my notebook and blowing with violence. He told me that he would like to be a twister, that he was feeling empty on that stupid function. And, suddenly, he invaded my underwear. I don´t know if he knows, but I´m gonna tell this to my boyfriend. Boring wind. Can´t you see you´re annoying me? Why don´t you go find somebody else to bother with your cry? In fact, I´m tired of writting about things I can´t touch. Wind. Love. Hate. Revolution. It´s better to write about food. Fingers. Cock. Yeah! Cock sounds great! That´s such good literary material. But here between us, writting about it? There are so much better things to do with... (6)

Semana

Segunda-feia
Terça-feia
Quarta-feia
Quinta-feia...

Sexta-bonita.

Beautifool

Pra cá, pra lá
Pra cá, pra lá
Elas avançam sem vacilar
Arrastando rabos-de-peixe
E olhares tontos.
Não lhes pergunte sobre
A crise americana,
A geopolítica da Guatemala,
Ou mesmo Machado de Assis
Elas dão de ombros.
Seus rostos embonecados
Milimetricamente maquiados
Apenas ocultam o vazio óbvio e enjoativo
que mora em suas cabeças.
Alimente-as
Com coca-cola, caviar e cocaína
That´s the way they like it.
Dê-lhes o greencard da melhor boate
Da maior noite
Então entorpeça-as com diamantes
Cubra-as de hematomas
e faça sexo com elas.
Interne-as
Seja numa clínica de desintoxicação ou de estética
E divulgue pelo google uma biografia não-autorizada delas. Elas lhe agradecerão.
Seus olhares poderosos, seus esquálidos corpos,
Sorrisos tristes, sem culpas ou remorços
A etiqueta do suicídio elas conhecem de cor.
Da Ucrânia a Cabul,
Beautifool.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Trancado na garganta

Meu pai está doente e, desde então, nosso contato tem sido muito superficial. Não é por conta da doença, isso jamais. Mas há bem três meses nossa relação estreitou-se tanto que limita-se ao indispensável. Isso não me faz bem. É quase inconfessável, mas não consigo fingir felicidade plena mantendo uma relação decadente com aquele cuja presença foi visceral nestes últimos 20 anos. Tento, mas o olhar dele - aliás, seu não-olhar - é inescapável punhalada no meu coração.
E hoje, tão sem porquê, ele estava na garagem da minha casa e, olhando-o da varanda, me dei conta disso. Por uma tolice. Acontece que meu pai é um homem de 52 anos e, ultimamente, é um tanto raro que homens nessa faixa etária ainda mantenham uma farta e negra cabeleira; o que é seu caso. Meu pai é e sempre foi muito orgulhoso de seus cabelos, e de repente, notei, do ângulo que o fitei, que seu cabelo perdera o viço, a cor e o volume. Notei que sua pele enrugou, empalideceu. Este vislumbre, trágico, trouxe consigo mais que uma vertigem física. Esse foi o mais memorável soco que recebeu o lado rancoroso de mim. Meu pai envelheceu consideravelmente nos últimos 10 meses. Sempre me deu tudo o que estava ao seu alcance, desde o essencial ao supérfluo, e é essa a minha grandicíssima gratidão: minha incrível capacidade de sobrepor todas as nossas picuínhas e problemas por tudo de bom que ele me proporcionou e fez durante toda a minha vida. Meu singular talento em ruminar seus defeitos, engolí-los e trazê-los de volta à boca, com um gosto cada vez pior. Em momento algum eu posso relevar o fato de que sua hepatite leva-o a tomar fortíssima vacina, que o deixa física e psicologicamente abalado, ou a fraqueza existente em mim de olhar pra dentro e reconhecer meus próprios defeitos. O que mais me dói é que, conforme alimentei esse rancor estúpido, o mesmo necrosou minha capacidade de amar meu pai, como coisa que se desaprende. O orgulho parece ter salgado o meu peito.
Centenas de pessoas, milhares até, dariam tudo para estar na minha condição enquanto filha de José Gonçalves, humilde enfermeiro, budista fervoroso, pessoa simpática e bem quista por natureza. E parece que sou a única pessoa que negligencia ou ignora este privilégio, e isto é um puro dissabor. Não dá pra esquecer um pai que, por mais ausente que tenha ficado durante a minha infância - sempre por conta de trabalho - estava lá. Me vendo, de alguma forma, orando por mim à sua maneira. É impossível dissociar assim, de uma hora para outra, todas as lágrimas que ele chorou comigo e por mim; a madrugada de seu aniversário que me levou às pressas para o hospital, quando cantava pra mim quando eu era pequena, o momento epifânico que testemunhou minha menarca. Não se esquece esse tipo de coisa; coração nenhum é capaz de tal frieza.
Eu o amo tanto, só não estou sabendo dizer isso. Seu jeito simples e atrapalhado. Suas mãos grandes. Sua teimosa positividade. Seu olhar seguro.
Eu o amo, tanto.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Dilemas temporários

Eu nunca nasci, tampouco estou fadado a morrer, como vocês. Eu não tenho idade, não tenho umbigo nenhum. Sou oniciente, sei tudo o que você fez tanto no verão passado como em todos os outros. Estou lá e aqui. A minha função é passar. Nada escapa do meu alcance: formigas, letras, sequóias, galáxias; eu consumo tudo, tudo me pertence. A única certeza que tenho é que por mais que eu passe, enquanto acumulo rugas no seu rosto, eu sempre sou. Não envelheço, meu caráter é o mesmo desde sempre e, ao contrário do que pensam, eu não mato ninguém. Vocês obedecem, apenas a um ciclo, como todas os outros seres vivos.

Há toda sorte de definições a meu respeito, mas por decerto não visto nenhuma delas. Eu estou aqui antes de Deus, tanto o que foi criado por vocês quanto o que realmente existe.

A despeito da concepção individualista, em primeiríssima mão venho te confessar um grande segredo: eu sou absolutamente constante. Uns alegam que não me têm; outros dizem que me têm demasiadamente e não sabem o que fazem comigo. EU te digo: mentira. Todos me possuem exatamente na mesma proporção; o que os difere é a forma com a qual me administram. Pôr a culpa em mim? Desaforo. Logo eu, que sou tão solícito, justo, invariavelmente imparcial e, como dizem tantas culturas populares, sábio.

Sabedoria. Sou sábio de verdade? É sábio observar tudo o que eu passo? Não, não é. É interessante. Acho que os seres humanos admitem esse conceito baseado em coisas, cargos ou pessoas que demoram pra conquistar, daí dizem que eu sou sábio. Mas sábio, eu? Não. Sábia é a perseverança; eu só sou a distância entre ela e o que quer que for.

Eu sou passagem, sempre. Nesse ponto, eu e você convergimos. Eu obedeço a uma função imorredoura de passar, e passar, e passar, e passar. Nada é eterno, somente eu, que aqui estou e para sempre ficarei. Mas vocês podem fazer a diferença, e ficar em mim por um bom tempo.

Por um bom tempo.
Nada é eterno além de mim, como eu já disse.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Fale baixo!

Hoje, voltando da faculdade de ônibus, percebi que havia um pai exemplar. Atencioso com os filhos, que eram dois casais, divorciado, e um tanto quanto chateado por não poder estar com eles amanhã, num sítio em Magé. Ele provavelmente ainda tem problemas com a ex-esposa, parece não ter digerido muito bem a separação e não gosta do marido-namorado-parceiro dela. Ah, e se você está pensando que sei disso porque eu levei uma longa prosa com ele no percurso Niterói-Caxias, está enganado.
Acontece que este senhor não estava falando no celular. Ele estava aos berros, de modo que da cobradora ao motorista a conversa (e inclusive o contexto) eram perfeitamente audíveis. O cara parecia estar dando uma palestra, e de um hábito que eu o-deio, por sinal: a deselegância de não saber conversar ao celular. Fiquei pasma. E ele mesmo não estava nem aí. Falou um monte de palavrões, e, não satisfeito, fez "psiu" para a moça que estava do outro lado do corredor do ônibus e começou a contar toda a sua vida. Das duas, uma: ou é excentricidade ou carência. Extremas.
Lembro de outro dia que, também no ônibus, fui testemunha de uma memorável conversa alheia. Uma moça, aparentemente muito distinta, virou uma verdadeira metralhadora de palavras ao celular. Aquilo não irritou somente a mim, mas às outras pessoas que olhavam, curiosas, pensando haver um megafone por perto. Gente, eu acho isso tão feio! E o pior é que a conversa denunciava que a menina em questão era uma bela fofoqueira. Bom, você deve estar aí pensando: "mais fofoqueira é você, ouvindo a conversa que não lhe diz respeito!" Na verdade, no tom de voz desse tipo de pessoas, fica impossível tornar-se alheio à conversa, porque, de qualquer maneira, acaba chamando a atenção. E o ser humano é naturalmente curioso.
Nada contra mostrar que você é uma pessoa que tem sentimentos puros e reais em relação a outra. Nada mesmo. Exalte quem você ama, beije, abrace, diga todas as palavras bonitas DIANTE da pessoa, não o faça em um celular, principalmente a grandes decibéis. Até porque, como dizem por aí, a inveja tem sono leve.

domingo, 14 de setembro de 2008

Etiqueta orkutiana

Acho que orkut hoje em dia virou CPF. Identidade; pessoal, intransferível e que não fica só no plano virtual, não mesmo.
É cada vez mais comum a gente ver as pessoas reagindo por aí conforme atitudes tomadas no orkut. Quer simples exemplos? "Viu aquele scrap queima-filme que aquela garota deixou no orkut do namorado dela? Eles até brigaram por isso!" "Aí cara, tá ligado daquela mina que fuçou meu perfil, da faculdade? Tô achando que ela tá me dando mole!" "Caraaaaaca amiga, aquela pessoa fuxicou meu perfil e nem sequer me adicionou! Tá vendo!? Se fosse um desconhecido, mas pô, é aquela pessoa! Como pode, né? Também fucei o dela e, CLARO, não add." Tenho certeza que você se familiarizou com, pelo menos, algumas das três frases. Eu mesma disse a última, hoje. Isso não é estranho??
Acredito que a etiqueta orkutiana permeia sempre o que nós temos em mente, e está constantemente à frente das relações olho-no-olho em sociedade. Tem gente que acha muito mais fácil se comunicar mandando um scrap a falar diretamente. Uma mínima reação no orkut pode desencadear todo um mal-entendido dos grandes, pôr amizades e relacionamentos a perder. Nunca houve uma moda tão forte e influente quanto essa. Também penso ser uma grande babaquice tudo pôr a culpa no pobre orkut. Ele apenas externa o que muita gente quer dizer, mas não diz.
Incrível como o orkut determina as coisas e diagrama as pessoas. Tem gente que leva o orkut tão a sério que vai mais pelas comunidades de alguém que pelo que realmente conhece da pessoa, na convivência. E tem pessoas que se criam inteiras no orkut. Outro rosto, outro coração, outro si.
O orkut é um quase-você, só que de fibra ótica.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O mundo misterioso dos andróginos

Sempre achei a androginia um tipo de dom natural. Fico impressionantemente estática ao ver um andrógino passar por mim na rua, na faculdade ou em qualquer lugar. Fico tentando decifrar o código genético, sua impressão no mundo e o seu natural deslocamento. Nunca vi anjos, mas se tivesse esta maravilhosa oportunidade, creio que eles seriam assim, como os andróginos que vagam por nós.
Eles são tão bonitos. E têm uma graça diferente, própria do seu "dom". São suaves. Prendem o meu olhar em seus rostos. Antes de mais nada, não estou falando de homossexualidade, que eu também respeito muito. Estou falando de androginia mesmo. Aquele valsar lento e que, quando termina, deixa nossos olhos com vários nós. Afinal, não sabemos se o que vemos é um homem ou uma mulher; à primeira vista ou sempre. No mundo artístico, minha andrógina favorita é a Tilda Swinton (As crônicas de Nárnia, Constantine, A praia). No filme Constantine então... nossa, ela atingiu o máximo da androginia e este post está sendo criado ao som de "Coming", música de Jimmy Sommerville e trilha de um filme chamado Orlando, de 1992, também com Tilda no elenco. Essa música é maravilhosa, mas ainda é melhor na voz de Edson Cordeiro e adivinham do que ela fala??? rs. Recomendo demais. Pra quem não conhece a super Tilda, tentem David Bowie, o eterno E.T mímico e andrógino Ziggy Stardust. Hoje eu nem o considero tão andrógino quanto ele foi, no pico dos anos 70, mas essa é a melhor imagem que ele produziu de si - e sempre a que lhe é mais associada/lembrada - até hoje. Lembro de uma reportagem que li numa revista sobre androginia, que trazia fotos de pessoas andróginas, logicamente. Achei muito interessante, mas também foi a única que vi nesta revista - minha mãe era assinante. Engraçado, quase não abordam desse tema, que eu acho tão interessante. Por que?
Gente andrógina pode carregar até um mundo inteiro no olhar. Elas bagunçam o nosso campo visual, porque, ao menor desequilíbrio da realidade o homem inquieta-se, e é exatamente isso o que os andróginos fazem. Eles desestabilizam tudo o que era exato, e desfamiliarizam nossas concepções mais primórdias e elementares do que mamãe ensinou sobre menininho e menininha. Eles, no fundo, riem disso, porque sabem que não se enquadram em nenhuma categoria, e têm essa estranha sorte de poder transitar entre os dois sexos com a liberdade de uma ninfa pelos bosques da eterna infância.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

... Essa inquietação gostosa de procurar

Ah, se a gente se contentasse. Que merda, que insosso, que inferno seria. Contentamento: s.m. (contentar + mento). 1. Ação ou efeito de contentar. 2. Estado de quem está contente. 3. Alegria, satisfação. Mas com verdades miúdas, pela metade? Nunca.
O ser humano é sempre descontente das conclusões que lhe chegam, por mais felizes que sejam. Se foi assim, poderia ter sido de outro jeito; se foi do outro jeito, poderia ser assim e a partir daí a cíclica gira, eterna. A graça só existe enquanto ainda não se tem o que se quer, enquanto a hora fatal ainda não chegou. Depois de vencida a obstrução ao objeto de desejo, a gente sempre vai procurar outro objeto de desejo ainda mais difícil pra superar. Essa é a graça. É o desafio que move o coração humano e, só quem vive de verdade, lutando contra o próprio contentamento é que pode ter a noção do que eu estou dizendo.
Não curto essa cantora, mas ela uma vez disse, muito inteligentemente numa de suas músicas: "Minha procura por si só já era o que eu queria achar". Todo mundo leva um pouco dessa frase como doutrina de vida; consciente ou inconscientemente. Essa inquietação gostosa de procurar é que vai desenhando a vida da gente, por mais que às vezes pensemos que estamos aqui a toa. De alguma forma, a maioria das pessoas está procurando alguma coisa, ah, está. Um emprego, um namorado, um biscoito, um cachorro, um cadinho de felicidade, um pedaço de coração. Essa busca é muito válida. É equivalentemente válida ao próprio objetivo da mesma, até porque a gente consegue medir a importância do que as pessoas procuram pela intensidade com a qual o fazem. Se você pensa que não é muito normal por ser uma pessoa inquieta, ah-ha! junte-se a mim, vamos dominar o mundo! [/pink e o cérebro]
Tá aí, essa é minha sorte de hoje pra você: procure as coisas ou as pessoas. As que acha que perdeu, as que sabe que tem competência para encontrar e, inclusive, as que estão perto de você. Sim, isso mesmo. Porque, a menos que você seja Deus, assim como eu, ainda tem muito o que procurar também.
Bom dia.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Nadismo? Ah, faça-me o favor...

Que os praticantes me desculpem o preconceito prévio, mas aos meus olhos, as pessoas não têm mais o que inventar. A moda agora é o tal do nadismo, uma prática inventada por um portoalegrense cuja finalidade é... fazer nada. Nada. Nadinha. Não gente, não é pra ver TV, entrar no orkut, dar uma cochiladinha, pensar em alguma outra coisa: é nada mesmo. Tudo bem, todos nós temos um invencível desejo, de, pelo menos durante um minutinho do dia praticar o tal nadismo. Mas eu bem disse: por um minuto. O que vejo de absurdo no nadismo é o total desligamento das pessoas com a realidade durante horas - isso mesmo, horas inteiras. Ah, peraê né?
Com tanta coisa interessante pra fazer, tantos livros magníficos pra ler, tanta gente pra ajudar, tanta louça pra lavar, um grupo de pessoas se retira e simplesmente adota uma louca filosofia de vida. Sabe qual é? Porque eu estou me incomodando? A cada dia que passa a gente vê uma coisa mais doida que a outra surgindo - e virando febre. E não temos nada com isso, a partir do momento em que ignoramos por completo a questão. Mas... a partir do questionamento e da pesquisa, já estaríamos inseridos? Ah não, lá vou eu refletir de novo... :S
Não sou ninguém pra julgar qualquer pessoa, e quero deixar isto expressamente claro aqui. Pode ser até que algumas pessoas se desestressem, que isso traga algo de bom para alguns, o que, se traz benefícios às pessoas, é um bom sinal. Acontece que, na minha tão limitada visão, toda essa estória não passa de uma porca desculpa para vagabundear com os olhos no teto. Sem culpa.

domingo, 31 de agosto de 2008

Diálogo com a árvore

Você não cansa não? No seu lugar, eu me cansaria. Afinal, todo ano é a mesma coisa: no verão, você ostenta uma copa cujo verde quase cega e faz sombra pra quem fica sob você; vem chegando o outono e o vento leva suas folhas pra longe ou ao chão (gravidade, baby). No inverno, a sua aparência é invariavelmente o plano de fundo predileto para filmes de caras como Stephen King, Hitchcock; essa galera boa. E - quanta previsibilidade! - na primavera começa tudo outra vez. E você renasce, como um bebê.
Te pergunto: qual é a graça nisso?? Você não canta, não fala, não solta um pum, não faz nada de diferente. Só serve de abrigo pra passarinho e pra cair quando tá velha, dando um tra-ba-lhão pra defesa civil. Aliás, há quanto tempo você tá aí, hein? Uma certeza eu tenho: você contabiliza o triplo da minha idade, no mínimo. Será que pensa o mesmo de mim? "Olha só, aquela besta ali, naquele quarto o tempo todo. Que tanto ela canta, que tanto se olha no espelho, que tanto escreve nesse caderno? Qual é a graça nisso??
Até que a gente se parece. Acho que é por isso que tolero você. Inclusive até me acostumei com as rugas nos seus troncos, com o som que suas folhas fazem ao vento (seria sua música?), com essa monotonia de ser o que você é. Às vezes, até consigo te achar... bonita.
É. No fundo, no fundo, é por sua causa e do resto de vocês que eu posso respirar. Obrigada.

sábado, 30 de agosto de 2008

Língua que se auto-devora

Já reparou como a gente encurta as palavras - principalmente nós, cariocas? - É medonho, mas já tá entranhado na gente duma tal forma que é irreversível. Não é preciso ir muito longe pra sentir isso. E sentir muito, com o perdão do trocadilho. Antes, a moda era falar lusitanamente, até pela nossa (infeliz) colonização. "Casar-hei, fazer-hei, "topar-hei". Mas a língua, voraz, abocanhou a letra "H" e o hífen com tanta força que as fez sumir, aglutinando todo o resto numa tão só, simples e moderna neo-estrutura: "casarei, farei, toparei". Mas isso também já está vencendo. Aliás, você não "irá gostar" deste blog; você "vai gostar" e acabou. Daqui a um tempo, vai ser só "arram" ou "ahn-ahn". E o gerúndio, coitado? Logo logo não haverá mais "D" (a língua e sua fome insaciável). É só "fazeno, dançano, cagano, moveno". E isso - pasmem! - não está errado. É só um bocado trangressão, mas errado não está.
As mudanças lingüísticas são tão sutis que às vezes faço a besteira de pensar que a língua está perdendo sua base de permanência. Mas não, não está. É só meu modo besta de pensar que é efêmero mesmo. Mas é gozado. Essas pequenas adaptações - afinal, é só isso o que elas são, adaptações, como uma puta que se adeqüa ao jeito de transar do cliente - estão aí para atender à necessidade de uma massa faminta por uma língua cada vez mais econômica, direta, que diga o que tem pra dizer e pronto. E seguindo esse vício, a língua corre também, a passadas largas, com medo de uma morte dolorosa que se chama desuso. A língua é um chicletão estatizado. Tá na boca de todos e todo mundo estica, puxa, enrola, faz o que quiser dela, alguns com um pouco de culpa e outros sem nenhuma. É assim mesmo.
A língua se auto-devora, é o maior dos origamis e se desdobra; é a escrava de uma massa cada vez mais frenética e que só sabe uma coisa: que quer falar, com uma agilidade de interpretação que beira o absurdo. Ela apenas reflete toda a cultura de um povo sedimentada nas suas costas cansadas. Mas tudo bem. Ela só existe com essa função mesmo, e não se queixa: vai estar lá, pronta pra servir e agradar a todo e qualquer um que queira utilizá-la.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Vinte e sete

Imaginação, alada!
Poparte
Warhola!
Sentido
Figurado
Deflorado
na testa.
Cabeça vazia
Oficina gerativa, do ócio à poesia
Ponte de idéias
Debruçada nas
águas da Guanabara
Inteligência imediata
Criatividade explosivo-radioativa cheirando
a tinta e plástico
Fantástico mundo de Ana.

Expresso de mim

Achei curiosa, incomum e super interessante a idéia de uma amiga blogueira - a Nana (http://chadesaquinho.wordpress.com) - de tentar definir-se com poucas/sucintas informações. E já que ela me indicou a tarefa - e acredito, não será muito fácil - vou tentar cumpri-la. Aí vai.
Adoro o som da minha pisada nas folhas secas;
Não gosto de me sentar em consultórios e me deparar com revistas de fofoca;
Adoro dar massagem com babosa pura nos meus cabelos;
Não gosto de quando as diferenças entre mim e o meu namorado dão voz à intolerância;
Adoro sorriso de criança (especialmente de Thales, meu primo de sete anos);
Não gosto de ver criança vendendo amendoim em terminais rodoviários;
Adoro reler agendas antigas e morrer de rir com minhas 'crisinhas' de pré-adolescente;
Não gosto quando aquela mosquinha chata resolve zunir ao redor da luz;
Adoro depositar flores entre as páginas de livros grossos;
Não gosto de quando calçados fazem bolhas dolorosas nos meus pés;
Adoro encapar meus cadernos com colagens de revistas;
Não gosto de tomate;
Adoro tirar pontas duplas dos meus cabelos em aulas tediosas
Não gosto de quando a luz resolve cair justamente na hora que resolvo atualizar o blog e;
Adoro tirar fotos quando meu estrogênio está regulado.

Viram? Nem doeu.
=)

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Eu sou uma máquina

Não, seu pervertido, não daquilo que você está pensando aí, mas, sim, eu sou uma máquina. Uma máquina não, uma fábrica. Melhor: uma fábrica não, uma indústria. Pronto. Eu sou uma indústria. Uma indústria que produz, entre dejetos, alguma coisa 'reciclável'. Saio escrevendo, tão desvairada e ilimitadamente sobre as coisas mais banais do dia-a-dia, em qualquer superfície que se possa rabiscar. Outro dia, me peguei escrevendo numa das folhas de uma planta chamada costela-de-Adão, que fica em frente ao bloco B da UFF, como também escrevo em papel higiênico quando a poesia fica insustentavelmente pesada, - afinal, sentar no vaso e ler revista tem hora que enjoa, né? - por isso, tenho sempre à mão uma caneta onde quer que eu vá. Escrevo, exponho. Da lata do lixo à atual crise belicosa da Georgia. Como se fosse importar ou mudar a vida de alguém. Só que eu não consigo parar, porque, pra mim, escrever é tão vicioso quanto roer unha. É bom, ajuda a não atrofiar o cérebro e mantê-lo sempre em atividade; pelo menos assim diziam minhas professoras primárias, ou, com a licença sentimental, "as tias".
Eu queria escrever sobre coisas mais interessantes, temas diversificados, qualquer-coisa-que-se-sinta. Fazer literatura com tudo é vulgarizar? Ah, não sei. E não tô interessada na resposta. Marcel Duchamps transformou uma privada em arte. Caetano compôs "Você não entende nada", uma canção belíssima que trata da rotina, e foi ovacionado. Porque eu não posso usar do reles, do cotidiano para fazer algo diferente? Honestamente? É porque eu não sei mesmo. Mas deixa assim. É chato explorar um tema tão mastigado né? E a pressão ainda consegue ficar pior porque isso aqui é um blog, e quem vem aqui (os fantasmas) espera temas "cult", com uma abordagem "cult", essa roupagem tão comum aos blogs, que eu definitivamente não sei obedecer ou penso não saber. Você deve estar pensando que este post tá com cara de desabafo, né? E se for?
Mesmo assim, sem seguir o "parâmetro" - ele existe ou é só um conceito lendário? - dos blogs, eu sigo escrevendo. Porque, como os atletas da Pequim de agora, a gente só chega à excelência com muito treino, por isso, reitero: dane-se se minha escrita incomoda, ou é feia, ou sem graça. Vou aprimorá-la. Enquanto isso, continuarei essa máquina sangrativa de escrever humana.

sábado, 16 de agosto de 2008

Eu e a capnolagnia

É feio gente, eu sei. Mas tá lá, e não adianta que não sai. Talvez seja até banal, boçal, mas fazer o que, né? Mas é, pelo menos, confessável.
Tá bom, depois dessa breve introdução estrategicamente anafórica, vamos ao que interessa, até porque daqui eu já consigo ver os dentes superiores de vocês indo de encontro ao lábio inferior. Eu tenho capnolagnia, e eu tenho uma certeza (quase) absoluta que eu não tô sozinha, senão a Derby, a Hollywood, a Luck Strike, a Carlton e um sem número de outras marcas de vocês já sabem o que iriam à falência. Não posso afirmar com precisão, portanto, não sei se minha capnolagnia é fruto da propaganda em massa em torno do consumo do cigarro - e num país cujo tabagismo encontra-se largamente difundido entre jovens com idades compreendidas entre 13 a 20 anos, isto pode ter lá sua relevância - ou de, quicá, uma pré-disposição genética para a coisa.
Acontece que, como uma boa menina educada no Colegio Santo Antônio das Irmãs Franciscanas de Dillingen, até os meus 12 anos, aproximadamente, eu tinha uma aversão fortíssima ao cigarro. Mas aí comecei a crescer, ver o mundo (BEM) fora do que até então pregavam as freiras de lá, e a imagem do cigarro - mais especialmente de homens fumando - me atraía, sempre, nunca soube porquê. Comecei a fumar muito nova, com 13 anos, esporadicamente. Pode soar clichê, mas não me considero uma viciada. Posso chegar a fumar até 2 cigarros por mês, no máximo, sem sentir falta deles. Acontece que sempre fico com o olhar fixo no homem que fuma, como se o "tarasse", pelo simples fato de estar fumando. O que é isso? Capnolagnia.
Não sei. Acho sexy, acho wild; aquilo ali entre os dedos dele puxa os meus olhos e eu começo a orbitar em torno daquela fumaça. Faz um mal imenso à saúde, eu tenho consciência disso. Mas até algo agressivo pode ter a sua beleza, ainda que exótica. A ilustrar, eu tive delirantes poluções noturnas depois de assistar The Doors - o filme, e não só esse. Tenho um fraco por todos os bad boys do rock, especialmente setentista, justamente por isso.
Sei que soa muito ruim da minha parte, mas nada melhor que dar uma tragada profunda depois daquela trepada - os mais conservadores que me desculpem, mas aí não cabe outro termo. Tudo bem, depois de ser abraçada pelo eleito, e ouvir o sistemático "eu te amo". Feliz ou infelizmente, o meu namorado não fuma e é veementemente contra isso; o que é bom pra minha saúde, porque desde de que oficializamos o nosso namoro, os cigarros caíram drasticamente. Sou forçada por ele a não fumar mais, e até que tenho me saído bem nisso. Fumo, pelo menos, um cigarro em uns dois meses. Não o faço para acompanhar nenhuma moda, eu gosto mesmo. Mas espero abolir o cigarro da minha vida um dia; definitivamente. Porém, o que nunca será possível extinguir de mim é a capnolagnia, até porque ela já me acompanha antes de que qualquer cultura pudesse ser imposta à minha maneira de enxergar o mundo e as coisas. Ela está lá, e explode vertiginosa e voluptuosamente dentro das minhas retinas toda vez que presencio um belo homem eliminando fumaça pelas narinas...

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Antes que a vontade passe

Não quero que o post de hoje soe como uma espécie de auto-ajuda, portanto, não acho interessante que você o leia com esse direcionamento. É mais pra exprimir o que eu penso.
Às vezes eu deixo muita coisa passar, mesmo estando com vontade de concretizá-las. Comprar um livro, tirar uma xérox, ir à dermatologista; coisas reles mesmo, que, apesar de reles, apenas refletem o meu descompromisso com a minha própria vontade. Hoje acordei pensando nisso, e talvez a incidência de um pensamento possa ser o feto da mudança, né?
Há dois dias eu cismei que ia cortar o cabelo. Muitas pessoas foram contra, falaram que tava bonito grande, e só uma menina - que também lê este blog e o corte se deve, um tanto, pela força dela - foi favorável à minha idéia. Fiquei nesse chove-não-molha, até tomar a decisão e decidir pela vontade. Sim, a vontade venceu o cansaço! Mas e se tivesse perdido? E se eu não tivesse cortado? Bom, isto só as mechas - que não foram poucas - espalhadas pelo chão do salão da Vanda, que é quase uma tia, podem dizer, ou se lamentar a respeito. Acontece que foi uma mudança legal, tava mesmo precisando disso, uma repaginada. Literalmente, um peso foi embora.
Acredito que a gente deixa, voluntariamente, oportunidades únicas escaparem pelos dedos, simplesmente por ter preguiça ou medo. É essa poeira que se aloja sobre a nossa própria vontade que acaba asfixiando qualquer mudança realmente significativa. Daqui pra frente, tentarei fazer o máximo possível das minhas próprias vontades, juro a mim mesma. Não quero que minhas vontades, ainda que momentâneas, se reduzam a desejos cristalizados - e irrealizados - até se perderem no tempo. Tirando as vontades meio doidas - de me matar, de querer terminar com o Jefferson por briguinhas simples, de fugir de casa, entre um sem número de outras - acho que quase toda vontade está no limiar da concretização. Esse próprio post é um exemplo disso. Comecei a pensar no que escreveria, e antes que as idéias me fugissem, tratei de pô-las num papel, porque estava com vontade e, se eu deixasse passar, este post não existiria. E é por isso que pra mim, chega da velha máxima de que "vontade dá e passa". Pelo menos agora, a vontade dá, sim; mas só vai passar depois que eu torná-la concreta.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Engraçado

Lembro quando pisei na UFF pela primeira vez, há aproximadamente uns dois anos. Do meu pai conversando comigo no ponto de ônibus, me desejando boa sorte e me advertindo juízo. De cara, achei que fosse a maior universidade do mundo. Fiquei realmente embevecida não só pelo tamanho dela, mas por todo o resto: o sol batendo nas janelas, os sorrisos dos veteranos, os cabelos vermelho-sangue das meninas, a convidativa e informal atmosfera universitária federal. Eu era só mais uma vestibulanda, igual a centenas de outras que deviam estar em algum lugar por ali, espreitando por trás das pilastras.
Vício de retina. Transcorrido o primeiro mês, a gigante UFF já não era mais tão gigante assim - metafórica e dimensionalmente falando - bem como os outrora pedestalizados veteranos eram tão de osso e carne quanto eu. Fiz amizades. Fumei uns cigarros. Sofri a dor e a delícia do meu trote. E fotos. Em pouco tempo, comecei a transformar a UFF e a UFF começou a me transformar também; porque a passagem, ainda que ligeira por esta grande universidade tem um imenso potencial transformador tanto em você quanto nela. E essa troca (acredito) majoritariamente positiva, foi deixando a UFF com a cara do meu quarto.
Hoje eu sou veterana, ou, como os "verdadeiros" veteranos costumam chamar, "caloura sustenida", porque estou no segundo período. Já acho tudo tão ordinariamente normal como se tivesse nascido e sido criada entre esses blocos que escondem tantas cenas, tantos segredos. Mas confesso que sou assaltada pela surpresa quando, por vezes, vejo tendas enormes armadas no campus, o movimento estudantil mostrando sua força, os estudantes lutando por um ensino e instituição públicos de qualidade. Isso me orgulha muito. E as choppadas. Ah, as choppadas. Ainda não fui a nenhuma, até porque não bebo (cerveja). Mas, pelo que dizem...
A única certeza da minha vida é que tenho muito o que aprender. E sempre terei.

domingo, 10 de agosto de 2008

Sexo no espelho

Amo o espelho. Ele é o meu amigo ou amante mais sincero, e meu namorado devia morrer de ciúmes dele.
Sempre me encontro no espelho. Antes de sair, antes de tomar banho, quando acordo ele é o primeiro a me dar bom dia. E também faço muito sexo no espelho. Muito mesmo. Registro o nosso amor em fotos. Sessões de cinqüenta, de cem, e livre do julgamento inquisitório da sociedade, as ditas-cujas moram numa pasta secreta no meu computador.
O espelho me conhece mais que ninguém. Ele é quem sabe de todas as imperfeições - que são muitas - que em mim se instalaram; seja pela falta de tempo ou excesso dele. Os melhores ouvintes são sempre os mudos, e o meu caso com o espelho é o casamento perfeito. A gente briga e se entende, como qualquer casal em harmonia, só que não somos exatamente um casal. Somos só eu e o outro lado, límpido e impregnado de mim, e acima de tudo, de vaidade. A vaidade é uma das maiores regentes do meu ego: mesmo sendo fisicamente desfavorecida em relação ao padrão social no qual eu estou inserida, a vaidade está instalada em mim como um vírus mortal. E é por isso que copiosamente eu transo - MESMO - com o meu espelho. Transo, faço amor, uso-o, maltrato-o. Vai muito do meu humor.
Tem dias que olhar no fundo dos olhos do espelho me traz força. Sinto-me até mais segura dos passos que dou na rua com uma boa encarada no espelho. Posso quase sentir o tapinha que ele me dá na lateral esquerda das costas, aquele "boa sorte" quando um amigo sai da sua casa. O espelho é um bom amigo, mas às vezes seu silêncio me irrita e me enche de dúvidas. "Vou com essa roupa?" "Vou com aquela?" "Vou com essa cara, vou com qual cara?" "Vou, não vou?" e diante disso o espelho se cala, como se nem estivesse lá, me abandonando à própria sorte no meu reflexo que nele se imprime, vazio.
Minha relação com o espelho é toda calcada na superestimação do meu eu. No meu egoísmo físico. E às vezes isso me lança à uma berlinda. Eu sou egoísta?
Creio piamente que, se o meu espelho fosse homem, ou ele seria o maior dos gays ou o melhor dos amantes.

Os hábitos dos outros

Meu vizinho tem o costume de fumar pelo menos um cigarro na garagem às escondidas. Minha mãe toma um copo d'água bem gelado em jejum pela manhã religiosamente. Minha irmã Luana sempre entra na comunidade do botafogo no orkut e troca várias idéias com pessoas que nunca viu pessoalmente. Meu pai, muito freqüentemente nos fins de semana liga sua caixa de som na garagem de casa e ouve (alto) suas músicas prediletas; majoritariamente o soul setentista. Sempre que chego à casa da minha avó Yolanda, ela está assistindo a programação da Canção Nova, uma emissora de TV católica. Meu namorado gosta de me morder.
Tem horas que eu paro e fico olhando pra eles. Que costumes, que jeito, que caras. Em cada milésimo de segundo mora uma expressão que é a marca registrada de cada um, pessoal e intransferível. E não raro estranho os hábitos dos outros. Aliás, acho que a gente metade acostuma, metade se questiona porque as pessoas agem como bem entendem. Principalmente quando o jeito delas em tanto difere do nosso.
Como eu já disse, até me habituei com a água em jejum de mamãe. Com as presepadas (que não consigo ficar sem) do meu tio Lizinho; ou do idioma piriguetês da minha melhor amiga, Elisa. Essas excentricidades, aos nossos olhos, servem para equilibrar nosso próprio universo. Afinal, não seria nada legal ou interessante conviver com pessoas exatamente iguais a nós, e isso é tão clichê de dizer que até cansa. Mas, em verdade, essas coisas, tão fora do meu eixo, fazem a graça dos meus dias.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

De repente 20

Vou fazer vinte anos no domingo, dia 27 de julho. E bate um medo, uma espectativa, um não-sei de coisas por dentro. Como é fazer vinte anos? Saberei. Não creio que vá mudar muita coisa, vai ser mais uma continuação dos dezenove; bem como os vinte e um será uma continuação dos vinte, e assim sucessivamente.
Mas é interessante. Apesar de eu sentir uma certa insuficiência existencial, como se fosse um vazio, por não ter feito nada realmente significativo nessas duas décadas que vivi. Isaac Newton, aos 18, já era um gênio da física; Ramanujan, matemático indiano, brincava com o dom que lhe foi dado bem antes dos 20, entre outros notáveis, que começaram a revolucionar o mundo tão cedo. Mas eu sou preguiçosa. Ai, eu admito eu sou, por isso o retardo pra mudar as coisas.
Vinte anos. Pode parecer uma preocupação tola (muitos acham que é flor da idade, mas não! é uma total torrente de preocupações e anseios), mas penso no legado que irei deixar aqui. Soa até como uma "velhice precoce", mas acho que a gente precisa deixar alguma coisa: filhos, bens (tanto materiais quanto imateriais, uma árvore, um cachorro, uma frase, o que for!
Acreditem, porque vou ser muito sincera com vocês: estou há três dias para fazer esse post. E não sei exatamente porque, nem existe razão aparente, mas ele está sendo extremamente difícil de concluir. Talvez seja proporcional à minha incapacidade de domar a espectativa em fazer aniversário; sempre gostei muito do dia 27 de julho; mas talvez seja, sim, um poquinho do esperar ansioso pelos primeiros vinte.
E vim dividir isto com vocês essa noite.
Boa noite.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Quer saber? Eu sou gordinha, sim!

Olá, cara pessoa que me lê. Sabe que hoje acordei com uma sensação estranha, de descontentamento com o meu corpo? É. Daqueles dias que a gente olha dentro do armário e consegue encontrar até Nárnia, mas não acha uma roupa que nos vista bem. Olhei copiosamente para as minhas roupas, tentando visualizar uma, só uma que me injete um mínimo de auto-estima, coisa que eu tenho precisado estes dias. Desisto.
Vou à cozinha e tomo metade de um copo de um iogurte de mamão, que eu a-do-ro. Abro os armários, mas resisto aos biscoitos salgados; prefiro esperar pelo almoço. Não sei exatamente o porquê, mas retorno ao armário e faço uma longa análise no espelho, e constato exatamente o contrário do que pensava há minutos atrás: eu não estou tão ruim assim. Não mesmo! Pensando melhor, estou até bem. Bem comigo. Sim, eu gostaria de perder bem uns... seis, sete quilos, mas nada que me entregue ao complexo. Às vezes, eu até consigo gostar das minhas 'sobras', e olha que não sou só eu quem gosta. Tem um monte de menina por aí que tá sofrendo com crises muito sérias de 'anas' e 'mias' (inclusive desejo o melhor pra elas), ao que eu só tenho a agradecer a Deus pelo corpo que me deu, ainda que com suas eventuais falhas técnicas.
Além do mais, acho que a estrutura corpórea mais "cheinha" é a mais saudável, tanto visualmente quanto tacitamente. Acho mais interessante olhar para uma mulher que represente mais o padrão "brasileiro" de massa muscular que as esquálidas modelos que só ficam bem mesmo nos editoriais de moda. Há também o fato - que muita gente acusa de "a desculpa do gordo" - de que, devido à minha estrutura ser ASSIM, mesmo que eu passe meses vomitando de cara pro vaso que eu nunca ficarei com o corpo da Natalia Vodianova ou da Agyness Deyn; porque, muito mais que uma questão de estética, é uma questão de metabolismo. O máximo que vou conseguir com isso será 1, ou a perda de uns cinco quilos ou 2, minha morte.
A verdade é que esta última checada no espelho foi boa, porque assim eu aprendo a valorizar o que de melhor há em mim: a minha autoconfiança sobre a imposição que beira a imoralidade tratando-se do pensamento coletivo a respeito do que é belo, do que é aceitável, do que é quase oficialmente requerido numa sociedade de aparências e de status, e para um determinado grupo desta mesma sociedade, é quase um escánio exibir uns pneuzinhos por aí. Mas eu faço diferente, e descobri que eu sou mais eu. E quer saber? Eu sou gordinha, sim!

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Retina retém rotina

... e é isso aí mesmo.
zzz

Estrangeirismo é o cacete!

Agora vou radicalizar, meu leitor. E sabe porquê? Porque já deu no saco ler o que eu não quero por aí e ficar de boca fechada, sem me pronunciar. E dessa vez, já sei o que eu vou atacar.
Reconheço a sua razão em pensar que o tal do estrangeirismo é um assunto saturado. Eu também acho. Mas é com base justamente na repetição desse fenômeno que venho aqui protestar. QUE SACO é pegar uma revista (principalmente aquelas de moda) e me deparar com termos que não são da minha língua. O preconceito que em mim não existia definitivamente se materializou depois de hoje, quando consegui a proeza de achar, em uma única página, 9 malditas palavras abrasileiradas. O estopim? "Poás". Porra, quanto custa falar "bolinhas"? Ou então "cook designer". Tudo bem que designer é um termo sem correspondente, mas cook? Ah, faça-me o favor. Que fique anti-estético, que fique "designer de cozinha", mas, fala sério, que fique em português!
A banalização progressiva do estrangeirismo que eu vejo por aí é a responsável pelo meu repentino acesso de fúria quanto ao próprio. Ouço por aí gente falando quase em inglês, francês, sem a mínima necessidade ou noção do que diz. O que penso, de verdade, é que essas pessoas, tão pouco familiarizadas com o próprio idioma, buscam uma espécie de "glamour" na língua estrangeira, mas não se dão conta do atestado de otárias que passam a quem possui um pouco mais de conhecimento, e esse alguém não sou eu. Lógico, gente, a intenção era radicalizar, mas eu não consigo né? É claro que eu tolero um estrangeirismo "light", que não vá macular o verdadeiro sentido do que a pessoa quer dizer. Estou exausta até os ossos da cultura da futilidade, do passageiro, do entreguismo. A impressão que eu tenho é que as pessoas que recorrem a essas expressões como quem muda de roupa têm muito pouco ou nulo interesse pela língua mater, o que é tão profundamente triste. Oras, temos nossos neologismos, metáforas, eufemismos e disfemismos pra quê? Para enfeitar gramáticas e discursos empoeirados de lingüistas? NÃO!!! Eles estão aí para usarmos, até porque, nos Estados Unidos, Inglaterra e França, ninguém costuma dizer que vai cair num "samba" mesmo que vá, por mais aportuguesada que essa palavra seja e por mais carga histórico-cultural ela carregue. Lá, eles valorizam extremamente seu idioma, o que o povo daqui, na carona, podia fazer também.
Tento, ao máximo, usar do estrangeirismo só quando se torna mesmo uma ocasião inescapável. Aliás, não dá pra pedir, na lanchonete lotada, um pão com um bolo de carne triturado; é mais fácil falar hamburguer mesmo. Nem o garçom entenderia, não é mesmo? Restrinjo essa prática - a partir de hoje, semi-abolida - somente às expressões que não têm um correspondente, como o caso ilustrado. Por mais que pareça difícil, nesse nosso viver tão estupidamente digitalizado, eu vou sobreviver, ah vou! Mas, acima de tudo, vou continuar aqui, postando ora sim, ora não, as minhas desventuras, minhas indignações, minhas comédias particulares.
Em bom e claro português.
Bom dia.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Feliz alucinação

Invadiu a casa de Dionísio, e se sentiu na razão de fazê-lo. Seus olhos, curiosos, vorazes, varavam o lugar, que brilhava sobre a turva luz rubra, roxa, ou o que mais houvessem posto em sua bebida. Já podia sentir o odor da cópula irromper-lhe narinas adentro, passear por seu cérebro e descer ao seu própria sexo, pedindo, querendo. Derramando-se lentamente por todo o interior de seu corpo, um derramar incontido e quente num caldeirão de sensações.
Dia cheio. Ainda estava com as roupas do trabalho. Vagava silenciosamente pelas ninfas e pelos centauros daquele lugar sujo, no coração do Rio de Janeiro. Estava sem companhia, muito propositalmente. Riu-se. Dançou a música convidativa, orgiástica. Beijava quase todos os presentes, usou ácido. As ondas sônicas grudavam em seus ouvidos, incidindo sobre seus atos; todo mundo lhe beijava.
Selecionou então, no meio dos corpos quase uníssonos, uma bela ninfa. Levou-a para um outro lugar, e amou-a torridamente durante quatro ininterruptas horas. Jogou o dinheiro sobre o seu corpo nu, cuspiu nela. Voltou ao amálgama banhado pela oleosa luz irisada que saía de orifícios invisíveis. Bebeu, já sem roupa alguma, entre homens, mulheres, deuses e anjos. Sentiu então uma sensação estranha, como se alguém impertinentemente lhe observasse. A impressão começou a tornar-se progressiva, foi se distanciando das pessoas e procurando suas vestes. Não as encontrava. Uma angústia começou a apoderar-se de seu juízo, o que fez-lhe acertar uma garrafa de vinho na cabeça de um homem. Os presentes estarreceram-se com o sangue, jorrando pelo carpete branco. Seguraram-lhe. Socou a boca de uma mulher, quebrou-lhe os dentes. Livrando-se das mãos que lhe retiam, correu, como veio ao mundo pelo ambiente, procurando qualquer pano que lhe cobrisse a indesejada nudez, e saiu do recinto, num frenesi inédito.
Atropelaram-lhe na 7 de setembro, às seis e quarenta e três do domingo. Morreu com 22 anos, mas sentiu que podia morrer. Enquanto morria, ria-se. Morria feliz, as chamas do inferno envolvedo sua massa disforme outrora chamada corpo, um belo corpo. Abraçava a morte, e a morte lhe abraçava Os olhos risonhos davam adeus ao mundo, felicitados pela sorte de cerrarem-se para sempre.

terça-feira, 1 de julho de 2008

E ninguém sabe de nada / Bittersweet symphony

Boa noite, meu leitor. Tudo bem com você? Eu espero que sim. Porque comigo não está. Sabe quando você se sente como se seus sentidos estivessem dormentes, e tudo o que pensa é encontrar um lugar seguro pra chorar, se escorar? Sim, meu caro. É exatamente assim que me sinto no dia de hoje, mesmo que já tenha encontrado o tal lugar, o suposto recanto onde deveria me sentir segura (minha casa); no entanto, suas paredes me parecem frias e grandes demais.
É estranho (e incomoda) pensar que andamos nas ruas, indo em direção aos nossos afazeres, e, ao nosso lado pode estar um transeunte tão desnorteado quanto nós. A beira do suicídio. Ou que perdeu alguém muito importante, foi demitido, ou que pensa que a vida inteira desbotou, desencantou, descoloriu. E você passa por essa pessoa, cujo grito, mais nítido impossível, está nos olhos avermelhados de dor, e segue adiante. Você não a conhece, não pode ajudá-la; tem pressa da sua vida tão ocupada e egocêntrica.
Talvez mais estranho seja quando isso acontece com você. Aí, as pessoas reagem de modos diferentes: uns querem distância do mundo, uns querem abrir-se, como rosas ensangüetadas. Mas abrir-se para quem? Ligar o IPOD e ouvir aquela música depressiva? Pegar o celular e imaginar que está falando com o melhor amigo? Essas coisas não resolvem, apenas concentram ainda mais o nosso estado de baixo astral. Você está na iminência de desfalecer de desgosto, quer ensurdecer o mundo com seu lamento silencioso, e ninguém sabe de nada. Se sente desimportante, como se tudo o que tivesse vivido dos seus ? anos até agora valessem de nada; evanescessem no asfalto. E ninguém sabe de nada, ninguém está dando a mínima. Não sou hipócrita, não vou te lançar o clichê de "bola pra frente!", "sua vida começou agora", "não desista". Talvez isso seja até o certo (é), mas, dizê-lo agora pode te despertar ainda mais raiva da vida. E sei o quanto irrita, ainda que a pessoa que venha a nos tranquilizar esteja com as melhores intenções. Também não quero que você se mate, não. Acho que o mais sábio - se ainda lhe restar o mínimo de cabeça para isso - é saber aproveitar esse momento mais introspectivo para fazer uma reflexão profunda sobre o que está faltando. Ah, e se você estiver curioso porque lhe digo isso, não me sinto desconfortável (agora) em dizê-lo: fui reprovada no primeiro período em Teoria da Literatura, disciplina ministrada pelo professor Franklin Alves Dassie, da UFF. Os motivos agora não convém, mas um dia eu conto pra vocês.
Tento hoje finalizar este vômito de crônica traçando uma analogia de tudo o que disse com a música Bittersweet symphony (http://www.youtube.com/watch?v=V-Po8uJeoUw) do grupo The Verve. Acredito ser esta música o melhor retrato do desespero efêmero, da perda de controle e do caos interno que hoje se abatem sobre mim. No clipe, existe um homem que anda por uma rua, e esbarra nas pessoas, inconseqüente, desordenadamente, sem pedir desculpas, e que continua cantando. A música ajuda muito. Tem um arranjo muito bonito, apesar de que o vionloncelo introdutório me soa falsamente tranquilizador; como se fosse uma cadeira com um pé em falso, uma estrutura fictícia de solidez. Sob minha ótica, este homem, que anda sem direção, apenas está tentando conversar com os outros e expor toda a sua desventura ou parte dela. Hoje me senti assim. Fria, com cólicas menstruais pungentes, reprovada, chorando pelas ruas de Niterói, sozinha. Voltando pra casa, como quem ambiciona chegar ao nirvana da paz e da solidão.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Sonhos

Muito mais imaginativa que Akira Kurosawa, eu me definiria. Se você ainda não viu, assista "Sonhos", desse diretor japonês incrivelmente criativo e profundo. Mas hoje não pretendo explorar a temática de Kurosawa, mas, a minha própria.
Passo muitas horas na frente do computador na parte da noite, antes de dormir. Não sei se é isso que gera a minha hiperatividade durante as minhas poucas horas de sono, mas o fato é que eu tenho sonhos muito bizarros, como os de hoje. Ah, quer que eu te conte? Vamos lá.
Sonhei que era uma índia muito, mas muito gostosa. Não adianta vocês me zuarem porque era sonho mesmo. Eu tinha pele dourada e longos cabelos negros, bem Iracemada, bem idílica, envolta num lugar muito parecido com o que seriam as praias do Brasil quinhentista. Nesse interím chegam à mesma praia duas pessoas. Lenine e Gabriel o Pensador! Eu sei que vocês devem estar é rindo da situação, mas eu não inventei isso gente, eu sonhei com isso mesmo!! Sim, Lenine e Gabriel. Bom, eles viram a índia peladona (e gostosa, vale lembrar) passeando pra lá e pra cá e se apaixonaram. A índia? Bom... ela foi criada com conceitos muito legais e heterodoxos de poligamia, ou seja, ela queria... os dois. Certa vez, Lenine estava na rede com a índia (eu, né) e fazendo carinho nos cabelos dela. Quando Gabriel chega perto dele, olha para o corpo da morena e fala: "visão bonita, hein?" Ela, por sua vez, ri para os dois moços.
Eis que a índia Ana, um belo dia, sai sozinha pelo mato, quando topa com Gabriel. Este a olha gulosamente e começa a acariciar seu corpo, e ela, muito receptiva, cede aos encantos espanhóis do homem. Lenine descobre e, o que antes era amizade entre os dois, transforma-se numa disputa pelo coração de Ana.
Tá, a essa altura você já deve estar achando que eu romantizei e ficcionei totalmente o sonho, né? Mas não gente, no sonho foi isso mesmo! Só que (é sem sentido mesmo o que vou contar agora, mas foi assim que aconteceu) a praia - ou Ilha - onde era a morada da índia Ana, estava sendo ameaçada por um vulcão e por dinossauros - isso mesmo, dinossauros - que estavam saindo das lavas. E assim acabou o sonho, o delicioso sonho do triângulo barroco mais 'hot' da contemporaneidade. Não teve explicação para o sumiço de Gabriel e Lenine, fato muito comum em todos os meus bizarros sonhos para os personagens então centrais.
Adoro sonhar, e tenho a sorte de sonhar toda noite. Nem sempre são sonhos bons, mas eu sonho sempre. Acho que é porque eu durmo pouco, e sonhar é tão gostoso, apesar do meu tempo (voluntariamente) limitado pra fazê-lo. Não sei - nem acredito - se exista alguém com tanta criatividade 'rêmica' quanto eu. Se você tiver sonhos assim, bizarros quanto os meus, me conte, porque às vezes eu me sinto como se fosse a única nesse mundo com essa faculdade...

terça-feira, 24 de junho de 2008

Você não tem mais dez anos

Você não tem mais 10 anos. Já pode sair à noite, tomar umas cervejas com os amigos e disseminar um pouco – aconselhável – do seu sexo por aí. Você não pode mais pensar que amanhã dará tempo, porque sabe da hora do rush, sabe que seu chefe quer uma planilha exemplar e que sua crônica enxaqueca não vai fazer o mundo parar. Você está encarregado de correr para sempre, e sempre sem direção; porque você não tem mais 10 anos. Às vezes, você pensa em desistir, você pensa em jogar tudo pro alto; o professor pega no seu pé e a absorção da matéria é impossível. Os monstros verde e roxo foram embora pra sempre e te deixaram sozinho no quarto. Ou você pode fantasiar que eles metamorfosearam-se em promissórias, em angústias, na síndrome do pânico, em dívidas. E então você bebe, pra esquecer. E chora pra equilibrar.
Sim, infeliz ou felizmente você não tem mais 10 anos. E, quando no raro instante em que se deita e olha para o teto, lembra-se do joelho ralado, do último dente de leite, dos sonhos com beijos e da então – hoje – estúpida vontade de crescer. Mas você é devolvido à realidade num baque surdo do despertador que anuncia uma outra atividade qualquer do seu dia, e com ele, a certeza da continuidade, a teimosa possibilidade de melhorar as coisas, uma brasileirice inerente isso, talvez. Entretanto, este é o barco fantasma que nos guia no mar arredio da vivência – ou dessa estética mecanicista de vida. Apesar da bela roupagem, esse saudosismo no fundo é um sintoma que a passagem do tempo, para você, não está sendo uma coisa boa, então, o que fazer?
Você sabe? Eu não sei.

Pior que a tristeza

Boa noite, meus hipotéticos e queridos leitores. Hoje, me sinto um tanto quanto envolvida numa nuvem de letargia, o que me inclina para um assunto quase óbvio. Faz 23 graus esta noite aqui, no Rio de Janeiro. Gozado, tenho um namorado que estava dormindo comigo há dois dias, no maior amor; minha melhor amiga acaba de chegar à cidade, fervilhando de vontade de sair, para curtir uma festa qualquer. E eu? O que penso disso tudo?
Minha resposta é simples, e mais direta, impossível: estou de MAU HUMOR. MUITO MAU HUMOR, diga-se de passagem. E sono. E desgosto. É como se este feriado estupidamente ensolarado não tivesse valido de nada – que Deus perdoe esse meu egoísmo – porque eu simplesmente não me diverti. E a impressão é de que não o farei.
Numa tabela das piores emoções, em primeiríssimo lugar eu consideraria o remorso. Afinal, é aquela vontade inútil de tentar fazer o tempo voltar atrás. Mas em segundo – e quase competindo com o primeiro – não entram nem raiva, nem tristeza, nem ódio: o segundo pior sentimento que odeio sentir é o tédio. Oh Deus, o tédio. É como olhar por um aquário durante três minutos e achar que ficou ali durante dez semanas. É a obsessão em brincar de adiantar os ponteiros do relógio. É retirar o esmalte das unhas no dente, é uma elegia à loucura. O tédio me enlouquece, sabiam? Eu simplesmente tenho horror do tédio, dá uma vontade de chorar, quase supera a TPM. E o pior é que o tédio, quando me invade, não deixa lugar para nada: apesar de eu tentar improvisar outras atividades, o tédio vem e arrebata qualquer raiz de qualquer outro projeto. É um erva daninha, o tédio.
Ando de um lado para o outro dentro de minha modesta casa, e sinto como se ela tivesse quadruplicado de tamanho. Ai, que vazio, que desalento. Estar sozinha numa casa com três pessoas que tão bem me conhecem. Discutir com um namorado que amo.
Tudo por conta do tédio.
Verdade é que, por sorte minha, meu tédio é efêmero – ou eu espero que seja. Espero que, depois daquele banho, daquela maquiagem e de uma boa injeção de auto-estima – nem que seja disparada por um estranho - eu volte a ser a mesma Ana sorridente e espevitada que me é característica, porque eu já moro em prédio, e decididamente não espero seguir o exemplo do Bruno, do Biquíni Cavadão.