sábado, 4 de outubro de 2008

Para compreender Deus

Se tenho duas únicas certezas nessa vida, elas são que um dia morrerei e que nunca, aconteça-me o que me acontecer, perderei a fé em Deus. Apesar dele me parecer estranho, às vezes. Apesar de permitir que coisas horríveis aconteçam às pessoas. Mas a fé, nele, ah, isso nunca perderei. Por que? Porque, mesmo parecendo distante e imaterializado, ele sempre arruma um jeito, um jeito só seu, de me responder. Não, nem sempre responde. Mas ele se esforça para que eu o veja.
Confesso que estou muito chateada com Deus hoje. Me pergunto por que, em sua infinita sabedoria, ele permitiu que um amigo meu fosse assassinado. Uma pessoa trabalhadora, que só estava galgando seu espaço nesse mundo. Que sempre trazia um brilho fantástico no olhar. Não éramos os maiores amigos, mas ele fará falta na praça. Lá que o conheci, e onde ele trabalhava. Seu sorriso, seu jeito engraçado e descontraído de fazer amizade. A notícia de sua morte me pareceu piada. "O Luan? Fala sério!" e assim me parece até agora.
É nessa hora que volto meus olhos a Deus, procurando, exigindo resposta. Por que? Por que ele? Um rapaz bom, esforçado, não se misturava com quem não presta. Por que ele? É justo? Se é ou não, isso não compete a mim, afinal, é a vontade de Deus. De Deus. Mas por que?
Fui buscar respostas no céu, que se desabava em uma chuva pesada nesta triste tarde de 04 de outubro. Estava no quarto, me perguntando a retórica "por que", quando a porta abriu. Pensei que fosse o vento, mas quando vi, era minha prima, Fernanda, que vinha chegando com sua risadinha feliz. Agora percebo. Era Deus entrando pela minha porta, mas não me dava por convencida estando com o coração duro de revolta pela morte do meu amigo. Eis que resolvi subir as escadas do meu prédio, que dão para o terraço. A chuva caía, impetuosa, livre. Só me pondo sob ela que pude entender. Seu beijo gelado, encharcando meus poros. O salgado das minhas lágrimas se misturando com o doce da chuva. Era Deus me respondendo. Raios e trovões rasgavam o céu de fora a fora. Deus conversando comigo. Eu quis gritar, mas já tinha a certeza de que ele já estava me ouvindo. E, lá dentro, nos recônditos dos meus tímpanos, eu podia ouví-lo dizer. Tenha fé, Ana Líbia, tenha fé.
Então desci as escadas e voltei, pingando dos pés à cabeça para casa. Tomei um banho e me pus a pensar na grandiosidade de Deus, e no seu mistério mais claro: a fé. A fé invisivel que salva a gente das horas mais amargas da solidão, e que nos traz de volta ao eixo. A fé, que abre os meus olhos e me faz ver o Luan sentado ao lado de Deus. Deus.
Horas mais tarde, eu sairia com meu namorado. Aliás, hoje nós completamos um ano e onze meses de namoro. Mencionei que estava com vontade de escrever, e sobre Deus. Eis que ele me pergunta: "antes de tudo, você precisa saber o endereço de Deus. Você sabe qual é o endereço de Deus?" a resposta veio, categórica. É certo que o endereço de Deus não são assembléias, igrejas. O endereço de Deus é o sorriso espontâneo da Fefezinha. As mãos estendidas e abertas de um estranho para o outro. A chuva boa que vem lavar a rua, a tarde, a alma. Deus mora nestes pequenos detalhes. E só é possível compreendê-lo fechando-se os olhos e abrindo - por completo - o coração.

Descanse em paz, Luan. A gente se vê um dia.

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