terça-feira, 28 de agosto de 2007

Campeões predestinados

O ser humano é naturalmente competitivo. Porém, qual surpresa é em dizer que essa competição já data de sua pré-história particular.
De repente, cópula. Mais de dois milhões de ágeis e efêmeros nadadores aventuram-se pelo escuro e escorregadio canal, do qual apenas um -três, no máximo - sairá vivo. Este é o exemplo mais primário da competitividade, ainda num breve e azóico momento do ser humano. Aqui, a competição já se fazia presente, antes mesmo da nossa existência.
Segue-se todo o processo placentário. E a mulher dá a luz a mais um pequeno competidor, que lhe reclama cobertor e alimento no primeiro instante dessa nova fase. Três anos depois, infância, e é imprescindível reiterar que é a partir daí que a criança começa a formular seus próprios valores, ainda que com uma visão muito frívola de mundo. Entretanto, estes valores são praticamente indissolúveis, e mostrarão-se fortemente atrelados ao consciente da pessoa, terminando por influir de modo lancinante, na vida adulta. Mas, voltemos à infância. O conceito de posse é análogo ao poder, de maneira direta. Você é estimado por terceiros por ter, e, conseqüentemente, é estimulado a atingir esse status - competição cruel essa, que amadurece já tão cedo, os mais tenros inocentes oom sua distorção.
Na adolescência e fase adulta, essa disputa é onipresente em qualquer sociedade; porém não deve ser encarada como individualismo, apesar de aquela acarreta neste. E é geralmente nas duas fases anteriormente referidas que a concepção pré-formulada sobre o assunto, lá na infância, finda por modelar completamente a psique humana, vindo à tona, acintosamente, pelo comportamento geral das sociedades apresentado há tempos homéricos.
A grande verdade é que o mundo é um imenso útero, no qual nós, desprotegidos espermatozóides, iguais em adversidade e uma minoria um pouco melhor em probabilidade estamos dispostos, de modo inteligente por uma força superior e muito além da mais elaborada compreensão. Sempre correndo, apressados, a fim de chegar pelo jeito mais veloz, nem sabemos bem onde; perdendo, na corrida, as impagáveis belezas do caminho. Todavia, a maior diferença entre o útero materno e o nosso planeta é que aquele é extremamente seletivo e acolhe, somente, um ou dois qualificados; ao que este é grande o bastante para abraçar-nos todos, embora o egocêntrico que existe dentro da maioria de nós queira sempre mais espaço que realmente necessita, nunca se dando a chance de ser acolhido na plenitude deste abraço.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Como será Frida

Frida é uma menininha que não existe. Uma coalização da minha mente e das minhas horas, de ócio quando estou só, e de amor com Jefferson. Frida, assim, Frida: minha filha hipotética.
Frida será de leão, com ascendente em áries. Terá os lindos olhos verdes do pai, os cabelos lisos da mãe. Viverá num lar onde o amor seja palavra de ordem; onde respeito, tanto pelos pais dela, quanto pelos demais, será a conduta máxima. Aos seis anos, Frida acreditará em duendes, fadas, sacis, coelhinho de páscoa. Para que privá-la do tão breve período de sua vida em que ela poderá ser ingênua, sem culpa? Com cuidado e limites, estimularei sua imaginação para que ela nunca deixe se levar pela leviandade do mundo; em contrapartida, serei a primeira a torcer pelos seus sonhos.
Quando minha filha atingir seus 11 anos, sentirei os temores de ser mãe de uma pré-adolescente; como dói adolescer. E o máximo que poderei fazer é inferir sobre as atitudes que terceiros tomarão em relação à sua conduta, ao seu caráter, com base na minha experiência própria. Paulatina e dolorosamente, Frida irá amadurecer. Ela chegará a seus 17 anos, e já terá uma certa maturidade quanto a várias questões, muitas das quais será instruída cedo, tanto pelo pai, quanto pela mãe. Frida será o produto meticulosamente conjunto de duas pessoas que se amam, e será exatamente a metade Ana, a metade Jefferson.
Discutirei com Frida. Ela vai me dizer palavras duras, que retribuirei, no calor da dicussão. Então, ela se trancará em seu quarto e chorará, copiosamente. Não nos falaremos, por dias, talvez. Ela vai aliar-se ao pai, quando isso acontecer, e vice-versa. Às vezes, se sentirá completamente sozinha no mundo, e experimentará a essência estranha do que é a escuridão.
Mas ela saberá voltar, pois, ainda que ínfima, haverá a chama acesa do amor que lhe trouxe ao mundo e nunca se esvairá de dentro dela.
Frida então terá seus 20 anos. Estará trabalhando, impossível dizer em quê. Ou dentro de uma faculdade. Fora do país, morando só. Ou ainda sob meus cuidados: impossível também calcular se ela nascerá sob condições normais. Acontece que Frida será a filha mais bonita, mais inteligente, mais maravilhosa e especial do mundo: será minha. Minha e de Jefferson.
Será a menina que vai mostrar que determinadas coisas vem pra ficar, que alguns nomes são imortais e imperecíveis. Frida será a razão que explicará os maiores mistérios do universo.
Frida é o amor. E o amor é a explicação de todas as coisas.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

A armadilha

Eu já cai. Você também. E nesta cíclica, todo o mundo cai. Quer um exemplo simples? "Olha só, como eu saí, até eu ri de mim". Chavões da propaganda, jingles inocentes, que estamos constantemente cantando, induzidos ao consumismo exacerbado, que tem por finalidade segregar e marginalizar, transformando classes sociais em verdadeiros pólos, cada vez mais distintos dentro da lógica capitalista. Pode não parecer, mas o que é tão embrionariamente involuntário representa a chave na economia das nações desenvolvidas.
A toda hora, somos bombardeados com toda a sorte de informações, que, por vezes se interceptam, se confundem e finalmente, se chocam no espaço real e cibernético. Este fluxo fleumático de informações nos assiste, por um ciclo vitalício, sempre a nos dobrar no cumprimento de sua vontade. Assim, fazemos publicitários estupidamente felizes e lhes concedemos plena ascenção, pois é do nosso deslumbramento que extraem seu ganha-pão, fazendo valer a máxima de Gobbels.
Entretanto, nem toda propaganda deve ser vista com tal negativismo, embora a exposição excessiva da maioria nos tente a julgá-las em uníssono. Afinal, o cartaz está aí pra lizer mesmo, como se estivesse vivo, no imperativo, "light my fire!". Cabe à cada cabeça estipular o limite, mas é aí que reside o leão. A linha tênue entre dominador e dominado tende a perder-se, em decorrência da falta de controle do ser humano frente a uma idéia tão sedutora. Saber dizer "não" é fundamental para que o público posicione-se sempre acima do apelo propagantístico, preservando, com esta atitude, sua identidade imaculada, e seu direito de escolha, sem as influências vorazes do meio externo.
Comprovadamente, o consumismo é o cancro que alguns especialistas julgam necessário para a regulamentação econômica e cultural do Estado. Todavia, é subjulgado ou intencionalmente esquecido o fato de que a demanda proposta atinge somente as classes média e alta, ao que a massa gorda que vive abaixo da linha de pobreza que olha pelo vidro tem, por direito, apenas este mesmo: o de olhar, sabendo que por mais que insista, dificilmente alcançará o patamar que almeja. E como o tráfico é maquiavélico e acessível o suficiente para esta classe, está justificado. Enquanto isso, eles sonham e alto, ao contemplar aquele lindo tênis na TV.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Inconsciente

Quantas vezes você, mulher, olhou para aquele homem estonteante na rua, que a olhou de volta, sem a real intenção de trair seu cônjuge? Algumas conservadoras irão se sentir no direito de crucificá-la, visto que esta sucetibilidade leviana pelo belo e proibido é minimamente condenável, já que vai de encontro ao pressuposto ortodoxo e homérico de fidelidade máxima na relação homem X mulher (sendo que é de responsabilidade feminina seguir isto à risca)
Do grupo das condenadas, então, hasteio minha bandeira em protesto: que visão mais barroca, esta! A natureza inerentemente nos inclina ao instinto da atração, e é perfeitamente normal que esta mesma atração esteja dissociada de nossos parceiros fixos. Sim, eu acredito na plenitude de um amor monogâmico e este não é um discurso feminista ou em prol da libertinagem sexual, da traição propriamente dita.
Acontece que, num dia inesperado, possamos nos encontrar aflitas por pensar copiosamente num homem inexistente ou que parece ter saído de algum lugar do passado para desestabilizar e assombrar o nosso relacionamento, dando margem à florescência de deliciosas e vulcânicas concupcências em nosso imaginário, cujo sigilo torna-se lancinante, conforme o pecado. E, por mais horrível que possa soar para os homens, esta é uma realidade corriqueira para muitas mulheres. Este flerte mental funciona como uma fuga inconsiente: é a canalização de todo aquele desejo represado, que transborda inutilmente na labiríntica psique feminina. Inútil é, porque não chegará à consumação, e é até importante para que a mulher em questão não se perca, não se esvazie com o passar do tempo.
É um modo quase involuntário de entorpecer o ego, valorizar-se, cristalizar a beleza e o amor próprios. Os homens são insensíveis e absolutistas demais para compartilhar desta visão, que não chega nem a ser liberal; mas, uma válvula de escape para as tensões rotineiras e os nós que só os massagistas surreais são capazes de desatar...