sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Tango de pés feridos

 Capaz de que seja mesmo sobre aprimorar o tango com os pés feridos. Pois é como dizem por aí sabedores apócrifos, dança é luta. Luta é dança. Então é sobre soerguer o peso, suspendê-lo com graça na unha dos pés, esperar a cãimbra vir e esperar a cãimbra passar, e no intervalo desse berimbolo não dito achar possível asfixiar o leão da ansiedade pesando sobre ele as boas e modernas maneiras das pessoas bem resolvidas que dançam quase perfeitamente o tango com os pés feridos. Do olho esquerdo da dor lambem-se as chamuscaduras (haja água pra tudo isso que foi de fogo), com as mãos em secreta concha a rogar que mais rápido aquela se dissolva com a providencial mão da cerveja e de alguns baratos beijos alheios, porque sim, assim sequer se está nos beijos, mas estes distribuem-se, e em troca pega-se tantos quanto se consegue, que a vaidade sempre foi o pecado favorito do diabo.