sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Quarando

 Não tinha mais que 7 anos, mas me lembro. Minha avó acordava cedo, para aproveitar que a casa ainda dormia, e ia lavar os lençóis. Sentada num banquinho de madeira gasto, espremia sua barriga grande entre as pernas e os ombros enquanto as mãos e os braços se ocupavam de esfregar repetida e veementemente aqueles grandes tecidos brancos. Não tinha máquina de lavar na casa de praia. Ela sintonizava o rádio em uma estação AM, e ouvia as notícias, as promoções de supermercado, e pequenos fatos fantásticos do cotidiano. Às vezes tocava um samba, e ela discretamente sacudia suas cadeiras.
 A bacia de prata fazia o rosto de minha avó brilhar, salpicando-o das pequenas estrelas que nasciam entre a luz e a água. Ela olhava pra mim e sorria, "vem ajudar a vovó", e eu ia segurar as pontas dos lençóis para deitá-los na grama e então, dentro de 7 minutos, todo o quintal havia se tornado um jardim do mais puro e branco algodão, cheirando a frescor e sabão, enquanto eu cuidadosamente caminhava entre eles testando meu equilíbrio ao me imaginar um títere de anjo suspenso pela vontade de um deus desconhecido.
 Naquela casa, todos os dias eram de sol.

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