Elas sempre estavam ali. E não estavam. Todo mundo via, todo mundo sabia, e ninguém confirmava. A mais nova delas era tão discreta, tão sutil, tão imperceptível quanto uma prateleira de frascos vazios no meio do espasmo sonoro da família à qual a mais velha pertencia. A mais velha. Era uma leonina tão vulcânica, mas tinha, por doutrina, a sinceridade. Quizumbeira. Costumava rosnar para os amigos e namorados novos das sobrinhas adolescentes, até que caíssem no seu gosto ou que os admitisse. E sempre bebia demais, sempre passava do ponto. Talvez isso as equilibrasse.
E elas eram amigas há muitos anos. Se amavam muito, sempre cuidavam uma da outra. As crianças não entendiam aquilo. A mais nova era uma 'tia' sempre longínqua - afinal, onde estava o tio? E aquele véu de incompreensão notório dos menores também povoava a mente dos adultos. O que havia ali? Elas desconfortavelmente tinham ciência da incógnita.
Não se assimilava muito bem. Afinal, a senhora mais velha tinha um filho criado. Sobre a mais nova, pouco se sabia. E ali sempre figuravam. Nos casamentos, nas festas infantis, nos churrascos, nos almoços dominicais. Com aquela aura de uma questão em suspenso; algo que se sabe, mas que se tabuliza para que não se firam orgulhos. Assim elas eram. Duas pretas bonitas, comedidas, que rezavam a cartilha da continência para não escandalizar moralmente os reis.
E todos convinham, sem que fosse preciso verbalizar, que essa paz um tanto hipócrita era bem mais conveniente.
E deste modo, elas sempre seriam duas senhoras obscuras tomando café.
Um comentário:
Interessante. Eu devo acompanhar as leituras seguintes.
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