segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Cariocas, afinal

Comecei a pensar nisso depois de ler uma entrevista com Maria Padilha para a Revista O Globo de domingo. Em determinado trecho, ela brilhantemente argumenta: "[...] Para eles, no fundo eu não passava de uma carioca. O carioca tem essa coisa no Brasil inteiro: a gente pode se esforçar, dar tudo o que tem, que no fundo eles vão sempre ver a gente assim: 'É carioca.'"
Eu sei, essa afirmação é tão completa que dispensa comentários posteriores. Mas acho que Maria sintetiza, nessa única frase, a impressão geral do carioca, que o acompanha feito sombra, onde quer que ele esteja situado - aqui ou lá fora. No caso do carioca, o gentílico chega na frente da própria pessoa. Ela é, antes de tudo, carioca. É um sei lá. Um chegar ligeiramente sambado, um menear de cabeça diferente. A gostosa malandragem do subúrbio. Uma pitada de água salgada e areia no olhar. Uma gesticulação relaxada, nunca desatenta; uma gargalhada espontânea, até quando se ri fora de contexto. O carioca tem essa coisa. Se adapta ao ambiente, ri e bebe junto, mas sem nunca perder sua identidade. Digo isso até com base na minha experiência de vida. Não viajei o Brasil todo, mas já fui aos extremos do país, e pude constatar exatamente isso que a Maria Padilha se refere em sua colocação. Nós já somos olhados de maneira diferente. Com uma certa admiração, curiosidade, despeito; um misto de coisas que residem exclusivamente na mente dos não-cariocas, e que afloram diante da imagem materializada de um carioca da gema. Ah, essa é a hora oportuna para desfazer alguns dos muitos mitos em torno do carioca. Nem todo carioca é um nighteiro insaciável. Tá, baladeiro se preferir. Carioca não passa informação errada pra paulista perdido em plena Rio Branco. Carioca não é marrento, nem odeia paulista, apesar de eu desconfiar que o contrário é bem possível. Entre outros milhares de clichês negativos envolvendo a nós, os cariocas.
Apesar do que possa parecer, esse não é um texto a fim de enaltecer os naturais do Rio de Janeiro. Que nada. Esse texto visa, apenas, desdobrar o comentário de Padilha, mais preciso impossível, que ficou na minha cabeça, e observa o carioca por uma perspectiva diferente das saturadas; nu de críticas ou elegias, na absoluta neutralidade. Porque o carioca é, acima de tudo, um pobre estigmatizado, um cidadão-símbolo máximo de sua cidade e assim será visto onde quer que se encontre, involuntariamente; pois a fama do Rio corre na mesma velocidade que a do próprio carioca. Fazer o que? Cariocas, afinal.

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