segunda-feira, 5 de maio de 2008

No meu tempo...

Coisa que me dá nos nervos, sei lá. Ta aí uma das frases que já trazem uma carga toda empoeirada, desnecessariamente. Quem nunca cometeu alguma besteira, fez algo diferente e ouviu, seja dos pais, seja daquela tia meio chata, da avó: "No meu tempo, isso assim assim..."?
Nostalgia é um sentimento pra lá de saudável. Quem é que não gosta de lembrar de uma época boa, que está seguramente guardada num lugar todo especial do nosso passado? Mas viver dessa nostalgia, sem vontade de se desprender dela e acreditar cegamente na impossibilidade de uma vida melhor é que é doentio. Não gente, não tô falando de algo utópico, isso existe sim, e vocês não fazem idéia de como é triste ver pessoas que se atrelam ao que já aconteceu e não conseguem viver uma vida em função do presente ou do futuro. É chato, mas acontece.
É até normal que os mais velhos façam essa analogia temporal conosco, para ilustrar melhor o que eles querem dizer. Mas quem faz dessa comparação um vício conversacional mostra que o falante está alheio à realidade e tende a desenvolver certa repulsa nas outras pessoas, porque o mesmo acaba ficando sozinho nas conversas. O mesmo serve para o famoso "nossa, ontem eu te peguei no colo!" Exclamação compreensível, que às vezes soa como um pequeno alarme particular que você já tem vinte anos - ou mais - e não plantou nenhuma árvore, por exemplo.
Voltemos ao "No meu tempo[...]". Acredito que existe uma certa aversão dos mais vividos para com a passagem do tempo e os costumes, que mudam conforme os anos. Justo. No passado, brincava-se de amarelinha de tafedê nas calçadas, e quase ninguém acha que isso seja obsoleto, muito pelo contrário: ao falar nessas brincadeiras, hoje quase extintas, vem à tona toda uma aura saudosista, como se aquilo fosse o melhor já inventado em termos de lazer humilde nos anos 70, 80. O "queimado", o "pique-alto", o "pique-cola-americano" nas ruas, sem medo. Brincar na rua, em se tratando da metrópole louca e violenta em que vivemos está difícil, e, mais que cultura, isso é um fator social. Hoje, a diversão das crianças são os videogames, a internet - com supervisão dos pais ou sem, tudo voltado para a parte eletrônica da coisa. Brincar fora de casa, no máximo, o play do apartamento. Fato: o mundo está cada vez mais digitalizado e eletronizado; não que isso seja tão péssimo, mas acaba por construir muros entre as pessoas numa época em que é tão salutar que elas estreitem o máximo de contato possível: na década de ouro da infância.
Nossos pais, na infância, se divertiam à sua maneira. Sim, existe muita diferença no que parece ser só um breve intervalo de duas décadas; mas diferença essa para abalar a cultura, estruturalmente falando. A cultura popular, a cultura familiar. Os anos trazem consigo o embate da modernidade X tradição, e isso não é a decrepitude da virtude nem a perda do valor; mas uma transição, uma alteração, quiçá uma interseção do passado com o presente.
É de muita ignorância que determinadas famílias urbanas - digo urbanas porque famílias do interior são ainda mais ligadas a valores antigos que as referidas - tentem, muito frequentemente à força, educar seus filhos do modo que foram educados. Com a rispidez e a disciplina extrema que lhes foram impostas. Eu olho para esse quadro e fico meio sem ação, porque o mundo muda, e o pensamento tem que seguir o fluxo. Se a pessoa insiste em mastigar costumes muito antigos, ela tende à exclusão voluntária. Sim, devemos preservar as nossas raízes sempre, mas oferecendo um terreno fértil onde também possa coexistir a cultura do novo, não em tensão, mas em harmonia com um pretérito perfeito que nunca deve perder sua importância ante a modismos e novidades.
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