domingo, 5 de abril de 2009

Os contos dos viajantes (Parte I)

O ponteiro menor do relógio já se prepara para abraçar as treze horas. Espero na fila pelo meu bonde, que é, em verdade, encantada aldeia das mais distintas gentes. Subo a escadela. Boa tarde, motorista. R$6,50. Passe.
Eis que se aproxima a primeira viajante. Celeste. Uma viúva bem resolvida e serelepe, no mais puro realismo do termo. Viajante viajada. Dois anos antes havia estado na Grécia e em outros países. Alguns dias depois, faria 62 anos, e sua saúde física e espiritual eram tão formidáveis que reduziam este número em pelo menos uma dezena. Simpática, com um ótimo gosto, adepta de festas com a neta e residente de Cabo Frio, abençoado recanto. Tranquilamente ainda degustaria de mais alguns bons 60 anos.
Dias depois do meu encontro com Celeste, à mesma hora e lugar conheci Roni, o paraense. Me ofereceu uma bala que recusei não por medo, mas por falta de vontade. Contou-me de sua odisséia até o Rio de Janeiro, e espantou a hostilidade do carioca nas relações humanas, quando disse ter sido ignorado nas vezes em que foi pedir informação. Ficou à beira das lágrimas quando começamos a conversar sobre times, que nele sucitaram lembranças do irmão, vascaíno inveterado como eu, de 14 anos, que a morte levou muito cedo. Atualmente, trabalha numa empresa niteroiense. Simples, humilde e promissor. Roni.
Não posso deixar de mencionar também o fiel Francisco de Oliveira Chagas, como ele mesmo se apresentou. Evangélico e fanho, tentou, num primeiro momento, peregrinar cruzadorescamente sua fé, mas direcionei a conversa para outro ponto. Aparentemente de origem pobre, o beata esperava por Jesus. E começou a me contar que estava aprendendo a tocar teclado, e o assunto fermentou quando eu disse que possuía um, e embora não soubesse ler as partituras, tocava conforme os meus ouvidos. Disse a mim que adoraria aprender (sic) latino, e quando eu lhe contei que estava tendo noções dessa língua, ele abriu um baú de perguntas deslumbradas, muitas das quais eu não tinha a mínima base para responder. Francisco de Oliveira Chagas. Siga em paz.

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