Aos não-cariocas, meu sincero perdão por este post. Porque ele tem a abençoada cidade do Rio de Janeiro (Zona Sul e adjacências apenas, infelizmente), como ponto de partida para que eu dê início ao meu relato. Ok, se você for um paulista, amazonense, ou curitibano com um certo conhecimento geográfico do Rio, poderá visualizar melhor o que direi. Mas não que essa seja a peça imprescindível na compreensão do texto.
23 de maio de 2009. Esta foi a data escolhida pelo artista californiano Peter Coffin para rechear de graça e ineditismo os céus da Zona Sul e Oeste do Rio de Janeiro. Se você está por fora, deve estar se questionando: mas que obra é essa capaz de tomar todo o céu? Simples: - mentira, é bem complexo - Peter, num momento de profunda inspiração, teve a brilhante idéia de construir um disco voador, que, na sua exposição, sobrevoará, além do céu carioca, outros por aí, mundo afora. Ou seja: foi massiva a repercussão dessa obra de arte contemporânea, que atraiu olhos curiosos ao negro firmamento do dia 23. Mas a questão que quero chegar ainda não é essa.
Sou moradora de Duque de Caxias, Baixada Fluminense do Rio de Janeiro. Logo, a supervalorização das zonas sul e oeste automaticamente excluem os suburbanos como eu do espetáculo, e o seu moço do disco voador não daria as caras por aqui. Entretanto, na mesma noite, eu teria um festival de música eletrônica a comparecer: o tradicional Chemical Music Festival, situado no Riocentro, Barra da Tijuca, o que poderia, talvez, me possibilar o vislumbre da obra de Coffin nos céus. E o céu noturno naturalmente me atrai tanto por medo quanto por fascínio. É uma sensação de mergulho na imensidão inapalpável, linda e desconhecida; é o receio de que ela subitamente possa me engolir com todo o seu bem estruturado sistema de vácuo e segredo.
Ao chegar à festa, isso lá pelas duas da manhã, meu coração dançava dentro e fora de mim às batidas alucinantes de Paranormal Attack, mas meus olhos estavam colados no céu. Eles pareciam imantados pela possibilidade de ver aquele disco voador fake, e captavam o menor deslize do menor corpo celeste. Pacientemente esperei. Eis que tenho a vaga impressão de... não, há de ter sido só uma impressão mesmo. Já sem esperanças, e muito afim de cair dentro da festa, ignoro o céu. Mas nas espaçadas vezes que o fito, tenho a estranha sensação de ver o disco voador de Coffin.
É aí que eu percebo o quão incauta eu fui.
Que Peter Coffin, que nada! Que legitimidade melhor poderiam usar os próprios amiguinhos intergaláticos para valsarem pelo belíssimo céu que se descortinou como um presente naquela noite? Com todo mundo muito ocupado com a exposição do californiano, eles poderiam exibir-se sem medo de nada. Ninguém acreditaria se falassem que foram vistos. "Que nada, o que você viu foi o disco voador daquele americano", é o que todo mundo naturalmente diria. E, movidos pelo desejo, e também pelo sentimento de provocação a nós, tolos terráqueos, que estamos sempre com a cabeça nas nuvens afim de solucionar nossas inquietações, eles livremente se exibiram, bem debaixo dos nossos narizes, despidos do cerimonialismo que estão habituados quando têm a certeza de que habitam a noite sós. Coffin pode ter escolhido a noite do dia 23 para expôr seu projeto, mas acredito que a noite os escolheu para a diversão. A noite em que Eles saíram pra dançar foi assim, tão óbvia, tão óbvia, que nós nem mesmo nos demos conta.
E foi linda. Mas só para quem viu - e quem vê - além de Coffin e de todo o deserto de obviedade.
Post dedicado a Fábio, um querido amigo que é um apaixonado pelo cosmo.
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